quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

A BUSCA DO CRITÉRIO DE MORALIDADE NA REFLEXÃO ÉTICA DE KANT

Francisco Nunes de Carvalho
Estudante de Filosofia - fnunescarv@hotmail.com

INTRODUÇÃO
Procuraremos aqui apresentar e discutir a busca do critério de moralidade na reflexão ética de Kant. Portanto, nossa pesquisa está situada no âmbito da reflexão ética ou ética filosófica, que trata acerca da condição de possibilidade do agir humano enquanto tal.
Mas em que contexto tal pensador viveu e quem foi esse que é conhecido na
história da filosofia principalmente por sua Crítica da Razão Pura?
Immanuel Kant (1724-1804), o filósofo de Königsberg, cidade da Prússia Oriental, foi educado no rigorismo próprio do pietismo (corrente do protestantismo que polemizava contra a ortodoxia dogmática luterana, afirmando as liberdades de consciência dos indivíduos e o primado de uma fé prática). Na universidade dedicou-se especialmente à filosofia (Wolff, Baumgarten,
Hume) e às ciências naturais – física e matemática (Newton)[1].
Vivendo no “Século das Luzes” e sendo legítimo filho do Iluminismo, Kant aposta na autonomia da razão e na “maioridade” do homem. O Esclarecimento (Aufklärung) pode promover a
liberdade autônoma daquele que faz uso do próprio entendimento. Para além das condições culturais, da manipulação do rebanho ou mesmo de uma revolução social, cada um deve romper com o comodismo da “menoridade” e conquistar a própria liberdade incondicionada[2].
Acerca do modo como a razão humana conhece, Kant tenta superar tanto o
dogmatismo do Racionalismo (idéias inatas como critério) como o ceticismo do Empirismo (experimentação como critério) através de uma posição própria: o criticismo. Essa é uma crítica[3] da faculdade da razão em geral, com respeito a todos os conhecimentos a que pode pretender, independente de qualquer experiência[4]. Tal crítica segue o paradigma da lógica formal, da matemática, da física (ciências que deram resultados concretos na chamada modernidade)[5], da história da razão humana enquanto transformações ocorridas por revoluções no modo de pensar, da revolução copernicana (os objetos se devem regular pelo nosso conhecimento)[6] e da distinção entre o fenômeno (o que aparece como objeto de nossa experiência) e o númeno (coisa em si, transcendente à experiência e incognoscível, mas pensável), sendo o conhecimento a nossa representação das coisas[7]. Mas a crítica, que mostra previamente a nossa ignorância perante a coisa em si, reduzindo a simples fenômeno tudo o que podemos teoricamente conhecer, tem também um aspecto religioso enquanto situa Deus, a imortalidade da alma humana e a liberdade humana no âmbito da coisa em si[8]. “Tive de suprimir o saber para encontrar lugar para a crença”[9], dirá abertamente o filósofo prussiano. A crítica kantiana está expressamente relacionada a uma atitude ante a religião[10].
Tendo apresentado esses sucintos traços contextuais e biográficos, juntamente com uma concisa exposição acerca da
liberdade e do conhecimento humanos segundo o filósofo de Königsberg, passemos agora a considerar a problemática ética propriamente dita.
Diante da pluralidade constatada ao longo do percurso histórico do homem, surge a eminente necessidade de fundamentar a prática moral para, assim, possibilitar a convivência entre os homens. A experiência nos mostra que há uma diversidade. Logo surge o questionamento: é possível, concretamente, vivendo num mundo plural (diversidade de culturas, costumes e tradições) chegar a um critério ético ou alguns critérios éticos básicos que sejam fundamentais e livremente aceitos por todos os homens? Como Kant desenvolve essa problemática do critério de moralidade?
I - USO TEÓRICO E USO PRÁTICO DA RAZÃO PURA
Em Kant, razão especulativa (referente ao
conhecimento) e razão prática (referente ao agir moral), com a crítica prévia, constituem uma só e mesma razão pura, que só na aplicação se deve diferençar[11]. A crítica, que possui um caráter transcendental, ocupa-se do modo de conhecer da própria razão pura especulativa, avaliando sua capacidade e limites, e buscando as condições de possibilidade do próprio conhecer[12]. No uso prático, a crítica, enquanto crítica da razão pura prática, volta-se para as condições de possibilidade do próprio agir moral e fundamenta a metafísica dos costumes[13]. Essa dupla aplicabilidade da mesma razão pura é acentuada por Weber:
“Embora sejam problemas diferentes, são funções da mesma razão. A primeira é a função da razão pura teórica, a segunda é a função da razão pura prática. É a mesma razão pura com uma dupla função ou aplicação. A preocupação central de Kant é com a parte pura de ambas”
[14].
A unidade e a “pureza” da mesma razão são caracteres básicos na filosofia kantiana
[15]. Da razão pura do sujeito transcendental é que vem a universalidade e necessidade de toda ciência enquanto tal[16]. Assim, tal conhecimento universal e necessário é possível somente a partir da razão enquanto estrutura formal a priori da subjetividade transcendental, posto que do objeto da experiência só se pode ter o particular e o contingente, o conteúdo material[17]. Eis aí a universalidade e necessidade da razão, ressaltadas por Chauí:
“Razão pura teórica e prática são universais, isto é, as mesmas para todos os homens em todos os tempos e lugares – podem variar no tempo e no espaço os conteúdos dos conhecimentos e das ações, mas as formas da atividade racional de
conhecimento e da ação são universais”[18].
Destarte, tanto o uso especulativo como o uso prático da razão pura, preparados previamente pela crítica transcendental, demonstram, segundo Kant, que a razão pura possui a capacidade de determinar a priori tanto o
conhecimento do sujeito cognoscitivo como a vontade do sujeito agente. Mas a condição de possibilidade dessa capacidade da razão pura é que o sujeito transcendental não seja determinado pela particularidade-contingente do objeto, como nota Weber:
“Se, no nível do
conhecimento, o sujeito não pode ser determinado pelo objeto, uma vez que deste não pode resultar a necessidade e a universalidade, no nível do agir moral, o empírico não pode fornecer o princípio de determinação das vontades dos sujeitos agentes, dado que dele (do empírico) só se origina o particular e o contingente. A razão deve, portanto, poder determinar por si mesma as ações com verdadeiro mérito moral”[19].
Segue-se que tanto na teoria do
conhecimento como na reflexão ética de Kant, o sujeito empírico tem de se abrir à universalidade da razão transcendental. Manfredo ressalta precisamente que “para Kant, e esta é sua descoberta fundamental, uma norma só se legitima na medida mesma de sua capacidade de universalização”[20].
Por ter como meta “a busca e fixação do princípio supremo da moralidade”
[21], a filosofia moral de Kant não pode fundamentar-se em conteúdos contingentes e particulares.
Conforme expõe Chauí, a reflexão kantiana acerca do agir humano situa-se no plano da busca do universal e, por isso mesmo, é uma moral formal, baseada no dever:
“O dever, afirma Kant, não se apresenta através de um conjunto de conteúdos fixos, que definiriam a essência de cada virtude e diriam que atos deveriam ser praticados e evitados em cada circunstância de nossas vidas. O dever não é um catálogo de virtudes nem uma lista de ‘faça isto’ e ‘não faça aquilo’. O dever é uma forma que deve valer para toda e qualquer ação moral”
[22].
Ascender da particularidade empírica ao universal, válido para todo ser racional é o objetivo
[23]. O filósofo de Königsberg busca, assim, desenvolver uma filosofia moral baseada em princípios a priori e, como tais, formais – pois somente da estrutura formal da razão pode vir a universalidade e a necessidade de um agir ético. Tal ética poderá valer para todos os seres racionais. Nessa ótica, a universalização do agir subjetivo a partir da razão prática é fundamental para que haja liberdade-autonomia e uma efetivação incondicionada da lei moral (dever) como critério de moralidade: o imperativo categórico.

II – O IMPERATIVO CATEGÓRICO – A LEI MORAL UNIVERSAL
Em sua reflexão ética, Kant pressupõe um “
conhecimento moral popular” e, assim, parte da consciência moral comum a todos, pois presume que todos sabem distinguir (pela lei moral) uma ação praticada “conforme o dever” ou feita “por dever” de uma ação por inclinação ou interesse, uma ação “por dever” de uma com intenção egoísta[24]. A partir do pensamento acerca da boa vontade, o filósofo chega analiticamente ao conceito do dever que a contém em si mesmo[25]. Já na segunda e terceira seções desse seu primeiro escrito de fundamentação da moral, Kant insere a faculdade da razão, pois “só o conceito de razão, ausente na primeira seção da Fundamentação da metafísica dos costumes, uma vez que não está contido na ‘compreensão moral comum’, ‘permitirá a Kant falar de um princípio formal; será o da vontade racional’”[26].
Assim, segundo o filósofo de Königsberg “a questão aqui não é a de saber se acontece isso ou aquilo, mas de que a razão, por si mesma e independente de todos os fenômenos, ordena o que deve suceder”
[27]. A razão que determina a vontade por motivos a priori expressa a universalidade da lei moral, que é válida para todo ser racional[28]. Conforme expõe Manfredo,
“Para Kant, a filosofia prática tem que ver com o processo de universalização do homem, com a determinação de leis que valham universal e necessariamente. Kant conhece dois tipos de lei: as que dizem o que é (leis da natureza) e as que exprimem o que deve ser (leis da
liberdade)”[29].
O homem não se contenta com “o que é”, mas busca sempre o “dever ser” enquanto autoderminação da própria razão. Comentando esse valor da racionalidade, o mesmo autor afirma que
“O homem, enquanto ser racional, não tem seu caminho já estabelecido, mas, antes, só é racional porque se autodetermina. [...] A única fonte de legitimação das normas da ação humana só pode ser a própria razão. Moralidade significa, então, para Kant, a ‘emancipação do homem para sua humanidade’, ou seja, retorno da razão a si mesma”
[30].
Segue-se que a abertura à universalidade da própria razão é fundamental na reflexão ética kantiana. Tanto que, de acordo com o filósofo prussiano:
“Praticamente bom é aquilo que determina a vontade por meio de representações da razão, e portanto não por causas subjetivas, mas objetivamente, isto é, por princípios que são válidos para todo ser racional como tal. Distingue-se do agradável, pois, que este exerce influxo sobre a vontade por meio unicamente da sensação em virtude de causas meramente subjetivas que valem apenas para a sensibilidade desse ou daquele, e não como princípio da razão válido para todos”
[31].
É claramente expresso o objetivo da filosofia moral kantiana: elevar o agir subjetivo-empírico à esfera universal – a lei moral válida para todo ser racional enquanto tal
[32].
De acordo com Kant, a razão determina a vontade a partir dos imperativos. Tais imperativos são precisamente ordenamentos que a razão (leis objetivas do querer ou vontade racional) dá à vontade subjetiva particular. Os imperativos podem ordenar hipoteticamente (“imperativos hipotéticos”) ou categoricamente (“imperativo categórico”)
[33]. Os imperativos hipotéticos (que possuem um caráter pragmático enquanto baseados na experiência e nos resultados concretos – o valor prático) representam a necessidade prática de uma ação possível como meio de conseguir qualquer outra coisa que se queira. A ação aqui é boa em vista de algum propósito possível ou real. Mesmo o imperativo que se relaciona com os meios para alcançar a felicidade, continua sendo hipotético, já que a ação não é ordenada de maneira absoluta, mas unicamente como um meio para atingir a outro propósito[34]. Aqui não é possível fundamentar uma moral universal porque é o sujeito quem elege seus fins. É um projeto subjetivo e condicionado, que busca tão-somente o que é preciso fazer para alcançar a finalidade almejada[35].
Já o imperativo categórico ou imperativo da moralidade representa uma ação como objetivamente necessária por si mesma, sem relação com nenhum outro fim ou propósito
[36]. Conforme Kant, o imperativo moral é formal e, portanto, universalmente válido para todo ser racional enquanto tal:
“Tal imperativo é categórico. Não se relaciona com a matéria da ação e com o que dela pode resultar, mas com a forma e com o princípio de que ela mesma deriva; e o essencialmente bom da ação reside na disposição que se nutre por ela, seja qual for o resultado. [...] Pois só a lei traz consigo o conceito de uma necessidade incondicionada, objetiva e, em conseqüência, universalmente válida, e mandamentos são leis a que se deve obediência, isto é, a que se deve cumprir mesmo contra a inclinação. [...] O imperativo categórico não é limitado por nenhuma condição e se pode chamar propriamente mandamento absoluto, posto que praticamente necessário”
[37].
Assim, o imperativo categórico, enquanto ordenamento terminante da razão, é uma “idéia reguladora”, válida para todo ser racional precisamente por ser formal, atendendo a exigência da necessidade e da universalidade. Nele a razão deve determinar imediatamente a vontade, independente de qualquer conteúdo material-empírico, meramente particular
[38].
De tal modo, a lei moral não depende do conteúdo experimentável, daquilo que “agrada subjetivamente”, mas estritamente da “forma”. É, por conseguinte, a forma da lei (respeitada enquanto lei – “deves porque deves”) que vale para todo ser racional, sem qualquer exceção
[39].
O imperativo categórico kantiano exprime a forma da lei moral (“o dever pelo dever, incondicionalmente”) como critério universal de moralidade
[40]. Deste imperativo da moralidade há algumas formulações[41]. De acordo com Weber: “O imperativo categórico, na verdade, é um só. O importante é mostrar seu desdobramento e estabelecer as devidas relações entre as diferentes formulações”[42]. Este é propriamente o caminho que seguiremos aqui. Eis, portanto, as formulações do “imperativo universal do dever”, de acordo com o próprio Kant:
1ª – “Age apenas segundo uma máxima tal que possas, ao mesmo tempo, querer que ela se torne lei universal”
[43].
2ª – “Age como se a máxima de tua ação se devesse tornar, pela tua vontade, lei universal da natureza”
[44].
3ª – “Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente, como fim e nunca simplesmente como meio”
[45].
4ª – “Age de tal maneira que a vontade, através de sua máxima, se possa considerar a si mesma, ao mesmo tempo, como legisladora universal”
[46].
5ª – “Age sempre como se tu fosses, através de tuas máximas, um membro legislador de um reino dos fins”
[47].
Primeiramente, é preciso ressaltar a distinção kantiana entre “máxima” e “lei”. Máxima é o princípio subjetivo da ação, o motivo da ação do sujeito
[48]. Lei é o princípio objetivo da ação, válido para todo ser racional e, portanto, universal – proposição sintética a priori[49]. O questionamento fundamental que o sujeito tem de fazer é simplesmente o seguinte, conforme Kant: “Ficaria eu satisfeito em ver a minha máxima adquirir o valor de lei universal (tanto para mim como para os outros)?”[50]
Portanto, como observa
Weber, a máxima deve ser elevada à universalidade da lei moral:
“Que minha máxima se possa converter em lei universal, através de minha vontade, é uma fórmula geral, válida para todos e em qualquer circunstância”
[51].
De acordo com as palavras do filósofo de Königsberg tal é o critério basilar do agir moral: “É necessário poder querer que uma máxima da nossa ação se transforme em lei universal: é esse o cânone pelo qual a julgamos moralmente em geral”
[52]. A imoralidade da ação pode situar-se apenas no nível formal: “Formalmente, a imoralidade está em, reconhecendo a validade universal de uma lei moral, querer uma exceção a seu próprio favor. Isso seria cair numa contradição, segundo Kant”, como nota Weber[53].
Na Crítica da Razão Prática há uma formulação rigorosa acerca dessa reflexão moral do sujeito:
“Interroga-te a ti mesmo se a ação que projetas, no caso de ela ter de acontecer segundo uma lei da natureza, de que tu próprio farias parte, a poderias ainda considerar como possível mediante a tua vontade”
[54].
Tanto nesse contexto como no da segunda formulação do imperativo categórico, quando Kant fala em “natureza” ou “lei universal da natureza” ele pretende expressar uma vida com capacidade racional ou consciência para indagar a si mesmo, também enquanto se relaciona aos outros. De tal modo podemos entender “natureza racional”
[55].
Com relação à terceira formulação, Kant considera o homem como fim em si mesmo, conforme expõe nos seguintes termos:
“O homem – e, de uma maneira geral, todo o ser racional – existe como fim em si mesmo, e não apenas como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Em todas as suas ações, pelo contrário, tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o são a outros seres racionais, deve ser ele sempre considerado simultaneamente como fim”
[56].
Quando ajo racionalmente, a humanidade, tanto em mim como nos outros, é um “fim em si mesmo”. Usar a minha humanidade ou a dos outros como simples meio não é uma ação universalizável
[57]. O humano como “fim em si mesmo” na perspectiva kantiana vem devidamente comentado por Manfredo:
“O sentido da existência humana emerge, a partir daqui, como autofinalidade. [...] Nessa perspectiva, o ser pessoal constitui exceção no seio da realidade; tudo o mais possui apenas significação condicionada e enquanto tal é inserível numa conexão funcional universal e nunca é querido em virtude de si mesmo. É perfeitamente lícito tomá-lo e usar dele em função de outro. O Homem, porém, é autotélico e enquanto finalidade revela-se algo fundamentalmente não-funcionalizável”
[58].
Cada homem representando autotelicamente a própria existência é um postulado fundamental, exposto com expressiva clareza pelo próprio Kant nestes termos:
“A
natureza racional existe como fim em si. É assim que o homem se representa necessariamente a sua própria existência; e neste sentido, esse princípio é um princípio subjetivo das ações humanas. Mas é também assim que qualquer outro ser racional se representa a sua existência, em conseqüência do mesmo fundamento racional válido para mim; é pois, ao mesmo tempo, um princípio objetivo”[59].
Esta é “a idéia da humanidade como fim em si mesma”
[60], “princípio que é a condição suprema restritiva da liberdade de cada homem”[61].
A quarta formulação refere-se à
liberdade-autonomia da vontade. Não estamos somente submetidos à lei moral, mas somos livres enquanto tal lei é uma legislação da própria vontade racional, é representada como causalidade intencional e autotélica, que dá a lei a si mesma[62]. Podemos dizer que tal formulação indica a liberdade como condição necessária da própria moralidade da ação. Weber ressalta essa relação entre lei moral e liberdade, que são indissociáveis entre si no pensamento kantiano:
“Que a lei moral possa ser dada a si próprio, e isso é
liberdade, constitui a exigência da responsabilidade de todos os seres racionais por seus atos. Por isso, a lei moral e liberdade são inseparáveis. Se a vontade somente é boa, quando pode querer que a sua máxima seja convertida em lei universal, é preciso que a liberdade seja uma propriedade atribuída a todos os seres racionais, e não só uma condição de minha vontade subjetiva. É preciso poder reconhecê-la também nos outros”[63].
A vontade racional dá a si mesma uma lei universalmente válida (sendo legisladora universal), tanto para mim como para qualquer outro ser racional, possibilitando a
liberdade[64].
Quanto ao “reino dos fins”, este é um ideal ético possível que considera a relação sistemática entre todos os seres racionais enquanto fins em si mesmos, onde se promove a
liberdade da vontade e a relação de toda ação com a lei moral, encontrada em todo ser racional, cujo princípio é agir conforme máximas universalizáveis em leis. É a cidade do homem consciente de si, consciente do próprio dever e da liberdade-autonomia. É o ideal de uma comunidade ética universal[65]. “A cidade dos fins [unificação da natureza e da liberdade] não é realizável no plano da história, a qual, portanto, permanece um movimento sempre aberto”[66].
O imperativo da moralidade remete sempre à capacidade universal da razão e à incondicionalidade da pessoa humana enquanto abertura à
liberdade consciente. Enfim, aqui são particularmente significativas as abrangentes palavras de Manfredo acerca da quinta formulação kantiana:
“Com a personalidade, estão de tal modo vinculadas
liberdade, autofinalidade e dignidade, que seu reconhecimento incondicionado é mandamento absoluto para qualquer um. O ser pessoal é assim um ser que é dado a si mesmo, um ser que não é deduzível de nenhum outro fundamento, exceto o de um ‘poder-para-si’. Ele é fundamentalmente este poder de autodeterminação, ‘autonomia’. Ser pessoa é viver a partir da liberdade, é fazer-se sujeito a partir da vontade livre, que independe de qualquer causalidade da natureza. A pessoa é o ser que se põe como fim em si mesmo. Liberdade é então a capacidade da pessoa para ser fim em si mesma, capacidade para a autolegislação”[67].
III –
LIBERDADE ENQUANTO AUTONOMIA DO SUJEITO AGENTE
A filosofia moral de Kant consiste basicamente num projeto ético de afirmação da auto-emancipação do homem
[68].Nesse sentido, compreende-se o Esclarecimento enquanto processo de autonomização a partir da razão humana. A “maioridade”, capacidade de fazer uso público da própria razão sem a direção de outrem, deve ser conquistada com coragem e esforço[69]. A reflexão kantiana está amplamente voltada para a liberdade, conforme Manfredo:
“A
filosofia de Kant é essencialmente ‘uma filosofia da liberdade’, pois, sendo a liberdade o horizonte unificador de toda a vida humana, ela é o horizonte unitário de toda a filosofia, a pedra angular de toda a reflexão filosófica. A razão, eis a tese fundamental de Kant, é, acima de tudo, prática. Ora, a essência da ação é a liberdade, o que significa afirmar que a liberdade é o ‘conceito chave’ da filosofia”[70].
Kant distingue as leis da natureza (estudadas pela ciência física ou teoria da natureza) das leis da
liberdade (estudadas pela ética, teoria dos costumes ou filosofia moral)[71]. Ele já afirmara que “A filosofia da natureza dirige-se a tudo o que é. A dos costumes, somente ao que deve ser”[72]. Portanto, a filosofia moral kantiana tem de determinar as leis da vontade do homem enquanto é afetada pela natureza, considerando-as como leis segundo as quais tudo deve acontecer, mas ponderando também as condições pelas quais com freqüência não acontece o que devia acontecer[73].
Para compreender a
liberdade do homem na perspectiva filosófica de Kant, é preciso considerar sua afirmação da dualidade entre fenômeno e coisa-em-si (númeno), ensinada pela crítica, conforme Weber expõe:
“Segundo Kant, é a crítica que nos ensinou a tomar um objeto numa dupla significação, a saber: como fenômeno e como coisa-em-si. Sem essa distinção, eu não poderia dizer que, enquanto submetido às leis da natureza, não sou livre, e, ao mesmo tempo, enquanto submetido às leis da razão, sou livre. Ou seja, devo poder pensar a
liberdade como condição de possibilidade da moralidade dos meus atos. A mesma vontade tomada como fenômeno (nas ações visíveis) está submetida às leis naturais e, portanto, não é livre, mas é livre, se pensada como coisa-em-si, isto é, não mais submetida às leis naturais, mas como vontade autônoma. Quer dizer, mesmo que a liberdade, enquanto idéia da razão, não possa ser conhecida, pode-se, contudo, pensá-la”[74].
Segundo Kant, o homem é um ser dual, composto de um corpo sensível – submetido às leis imutáveis e necessárias da
causalidade natural no âmbito dos fenômenos, e de uma razão – com capacidade de pensar o “em si” – aquilo que existe independente da experimentação dos sentidos, o incondicionado. Assim, somente enquanto seguimos nossa “razão prática” podemos fazer uma escolha moral, determinando livremente a lei moral em nossa ação[75].
A moralidade pode efetivar-se somente a partir do fato da razão prática, já que, para Kant, é simplesmente impossível uma “dedução teórica” da realidade da razão prática e do nosso conceito de
liberdade[76]:
“Esta
liberdade não poderia ser demonstrada. No plano dos fenômenos, isto é, da experiência, do que hoje chamamos ciência psicológica, eu vejo que meus atos, ao contrário, são determinados uns pelos outros no tempo. Aquele crime pode ser explicado pelas paixões de seu autor, pela deplorável educação que recebeu, etc. E, no entanto, o homem se sente responsável, por conseguinte, livre. Não esqueçamos que o mundo dos fenômenos, isto é, do determinismo, é um mundo de aparências. Por trás desse determinismo aparente, pelo qual o mundo se me apresenta no conhecimento, esconde-se a realidade numenal de minha liberdade[77].
É portanto, feita, por Kant, a distinção entre objetos da experiência, facticidade, determinismos da
causalidade natural (nível fenomênico, onde não temos liberdade) e o fundamento incondicionado ou noumenon, que, mesmo sendo incognoscível, pode ser pensado e possibilita a nossa liberdade[78]. A rigor, para Kant, a liberdade, assim como a imortalidade da alma e a existência de Deus, está fora dos limites do conhecimento humano[79]. Portanto, em Kant, a liberdade, a imortalidade da alma e a existência de Deus são postulados da razão prática[80]. Somente na razão prática se resolve a questão da liberdade, visto que o discurso teórico limita-se à esfera fenomênica (e a liberdade provém de uma proposição sintética totalmente a priori)[81]. Manfredo expõe a importância da razão prática para a liberdade na reflexão ética kantiana:
“A ação livre é aquela em que o homem não depende das determinações do mundo sensível, mas das determinações de sua própria razão. Livre, portanto, é a ação em que o homem determina-se a si mesmo. Nesse sentido, pode-se dizer que há, em Kant, primazia da razão prática, pois a autoconsciência, que já emerge no nível da razão teórica, plenifica-se enquanto processo de autodeterminação de si, que caracteriza o homem enquanto razão prática. O eu se possui a si mesmo quando dispõe de si a partir do mais íntimo de si e não é simplesmente determinado por forças estranhas a si”
[82].
Desse modo, para Kant a
liberdade só ocorre quando não é a sensibilidade empírica e sim a lei moral universal que determina a ação. Ou seja, quando a vontade é lei para si mesma (vontade autônoma):
“A autonomia da vontade é a constituição da vontade, graças à qual ela é para si mesma a sua lei (independentemente da natureza dos objetos do querer). O princípio da autonomia é, portanto, não escolher senão e modo a que as máximas da escolha no próprio querer sejam simultaneamente incluídas como lei universal”
[83].
A autonomia da vontade é, pois, a vontade que dá a lei universal às próprias máximas ou escolhe máximas universalizáveis – válidas para todo ser racional. A vontade dá a si mesma (auto) a própria lei moral (nomia), independentemente da experiência. E isso ocorre precisamente quando “a vontade, independentemente das condições empíricas, é vontade pura, determinada apenas pela forma da lei. Eliminando toda matéria da lei, resta tão-somente a forma. A lei moral, assim considerada, determina aprioristicamente a vontade”
[84].
Em suma, na perspectiva ética kantiana, a vontade deve negar o conteúdo empírico (inclinações, gostos, paixões, interesses etc.) e afirmar a universalidade da lei moral, dando tal lei a si mesma – sendo vontade autônoma. Conforme Manfredo “
liberdade, negativamente, é independência do tempo, das determinações da causalidade sensível; positivamente, liberdade é autolegislação, autodeterminação”[85]. Independência e autonomia da vontade são assim fundamentais à ação moral.
CONCLUSÃO


Qual o critério a partir do qual Kant determina a moralidade uma ação? No que concerne à reflexão ética, o grande desafio enfrentado pelo filósofo de Königsberg consiste em determinar racionalmente o critério fundamental para qualificar uma ação como ação moral e, portanto, ação universalmente válida. Buscando superar tanto os particularismos culturais como uma racionalidade meramente voltada para a dimensão empírica, o pensamento kantiano propõe a determinação da vontade a partir da “Razão Pura” – a estrutura formal a priori capaz de definir o ato moral pela forma da lei enquanto dever manifesto à consciência racional autônoma.
Assim a teoria dos costumes em Kant tem como critérios básicos:
1) A universalidade e necessidade da razão pura em seu uso prático. O agir subjetivo é elevado à esfera da lei objetiva a partir da razão não determinada pelo empírico – a razão autônoma.
2) O imperativo categórico (lei moral universalmente válida) enquanto ordenamento prático da razão à vontade. A máxima – princípio subjetivo da ação – deve poder ser pensada enquanto lei universal para ser considerada moralmente válida.
3) A
liberdade compreendida como autodeterminação, autonomia em relação às condições empíricas particulares. Tal liberdade consiste em não ser dependente do âmbito meramente empírico e ter capacidade de autolegislação – aplicar a lei moral universal às próprias máximas subjetivas.
Enfim, a “Razão Pura” é o conceito central, porquanto sintetiza esses critérios basilares e se efetiva como condição de possibilidade da própria moralidade. Kantianamente, somente a partir da universalidade da razão humana, razão não fechada nem limitada ao nível empírico, será possível fundamentar a ação moral.

BIBLIOGRAFIA
CHAUI, Marilena. Convite à filosofia.12 ed. São Paulo: Ática, 2001.
GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia. São Paulo: Cia. das Letras, 2003.
KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura.São Paulo: Martin Claret, 2002.
_____. Fundamentação da
metafísica dos costumes. São Paulo: Martin Claret, 2002.
MORRA, Gianfranco. Filosofia para todos. 3 ed. São Paulo: Paulus, 2004.
OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade.3 ed. São Paulo: Loyola, 2003.
REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario.
História da filosofia: de Spinoza a Kant. São Paulo: Paulus, 2005. v. 4.
WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1999.
ZILLES, Urbano. Teoria do
conhecimento. 3. ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1998.
“A moral de Kant” Disponível em
http://www.mundodosfilosofos.com.br Acesso em 17 maio 2008, 18:35

[1] Cf. REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4, pp. 347-349.
[2] Cf. KANT, Immanuel. Resposta à pergunta: Que é “Esclarecimento”? (“Aufklärung”). O processo do Iluminismo estabeleceu a distinção entre lei da natureza e lei da liberdade, um dos alicerces do pensamento de Kant. A liberdade é o pressuposto fundamental da Aufklärung. O caminho à emancipação ocorre somente mediante o exercício da razão como autocrítica, fonte de libertação de representações ilusórias. Cf. OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, pp. 139 e 146.
[3] Crítica aqui consiste em indagar a capacidade e os limites da própria razão humana. Criticar é pôr em crise, ou distinguir, separar, decidir, julgar a própria razão. Após um período denominado pré-crítico, Kant escreveu suas obras críticas: Crítica da razão pura (1781), Prolegômenos a toda metafísica futura (1783), Fundamentação da metafísica dos costumes (1785), Crítica da razão prática (1788), Crítica do juízo (1790), A religião nos limites da simples razão (1793) Cf. ZILLES, Urbano. Teoria do conhecimento, p. 113.
[4] Cf. KANT, Immanuel. Prefácio da 1ª ed. Crítica da razão pura, p. 17. “A proposição que aqui enuncio é simplesmente a de saber até onde posso esperar alcançar com a razão, se me for retirada toda a matéria e todo o concurso da experiência.” KANT, Immanuel. Prefácio da 1ª ed. Crítica da razão pura, p. 18.
[5] “Kant pergunta: é possível uma matemática como ciência? E responde que sim, à medida que com as intuições a priori da sensibilidade (espaço e tempo) o homem constrói a aritmética e a geometria (estética transcendental). Pergunta ainda: é possível a física como ciência? E responde que sim, à medida que o homem, com as doze categorias do intelecto (substância, causa etc.), conhece cientificamente o mundo (analítica transcendental). Enfim, pergunta: pode a metafísica ser ciência? E a resposta aí é negativa. O juízo sintético a priori, que nasce do encontro das sensações com as formas puras do entendimento (Kant assume conjuntamente o racionalismo e o empirismo), é sempre limitado ao fenômeno (=aquilo que aparece), nada pode saber do que é posterior (númeno ou coisa em si).” MORRA, Gianfranco. Filosofia para todos, p. 136.
[6] “Kant realiza uma ‘revolução copernicana’: a mente do homem (Eu transcendental ou Eu penso) não assume as suas leis cognitivas da natureza, mas as impõe a esta” MORRA, Gianfranco. Filosofia para todos, p. 136.
[7] Cf. KANT, Immanuel. Prefácio da 2ª ed. Crítica da razão pura. ZILLES, Urbano. Teoria do conhecimento, p. 124.
[8] “Nunca posso nem sequer para o uso prático necessário da minha razão, admitir Deus, liberdade e imortalidade, sem ao mesmo tempo recusar à razão especulativa a sua pretensão injusta a intuições transcendentes, porquanto, para as alcançar, teria necessariamente de se servir de princípios que, reportando-se de fato apenas aos objetos de experiência possível, se fossem aplicados a algo que não pode ser objeto de experiência, o converteriam realmente em fenômeno, desta sorte impossibilitando toda a extensão prática da razão pura” KANT, Immanuel. Prefácio da 2ª ed. Crítica da razão pura, p. 36.
[9] KANT, Immanuel. Prefácio da 2ª ed. Crítica da razão pura, p. 36.
[10] “Só a crítica pode cortar pela raiz o materialismo, o fatalismo, o ateísmo, a incredulidade dos espíritos fortes, o fanatismo e a superstição, que se podem tornar nocivos a todos e, por último, também o idealismo e ceticismo, que são acima de tudo perigosos para as escolas e dificilmente se propagam no público.” KANT, Immanuel. Prefácio da 2ª ed. Crítica da razão pura, p. 38.
[11] Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, prólogo, p. 17. “A razão é a faculdade que nos fornece os princípios do conhecimento a priori. [...] Denomino transcendental a todo o conhecimento que em geral se ocupa menos dos objetos, que do nosso modo de os conhecer, na medida em que este deve ser possível a priori.” KANT, Immanuel. Crítica da razão pura, p. 58.
[12] “Na Crítica da Razão Pura é demonstrado que o âmbito do conhecimento se restringe ao nível fenomênico” WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. p. 27. Esta delimitação entre fenômeno e coisa-em-si é fundamental na filosofia crítica kantiana: “Fenômeno. O fenômeno (do grego phainómenon, que significa ‘aparição’, ‘manifestação’) é o objeto da intuição sensível, na qual jamais captamos o objeto tal como é em si, mas como ele ‘aparece’ a nós. O fenômeno tem uma matéria e uma forma: a matéria é dada pelas sensações singulares e pode existir apenas a posteriori; a forma, ao contrário, não vem das sensações e da experiência, mas vem do sujeito; é, portanto, a priori e permite ordenar sistematicamente os dados sensoriais em determinadas relações.” “Númeno (“coisa em si”). As coisas, em si, não são objetos dos sentidos, mas podem ser apenas pensadas pelo intelecto: a ‘coisa em si’ é, por isso, um ser inteligível, um númeno (de noumenon), que para Kant tem apenas o sentido negativo de não ser fenomênico. O conceito de númeno é um ‘conceito problemático’, no sentido de que é um conceito que não contém nenhuma contradição e que, portanto, como tal nós o podemos pensar; mas é também um conceito necessário, a fim de que a intuição sensível não se estenda até as coisas em si, e seja assim limitada a validade objetiva do conhecimento sensível.” Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4, pp. 367-368. Mais à frente, falaremos da coisa em si enquanto “incondicionado”, que não pode ser conhecido, mas pode ser pensado conforme a exposição do próprio Kant Cf. KANT, Immanuel. Prefácio da 2ª ed. Crítica da razão pura, p. 31.
[13] “A razão humana não é somente ‘razão teórica’, ou seja, capaz de conhecer, mas também é ‘razão prática’, ou seja, razão capaz de determinar a vontade e a ação moral” REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4, p. 378.
[14] WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 16.
[15] “Kant chama de ‘pura’ a razão considerada como não misturada a nada de empírico e, portanto, capaz de operar sozinha e, por conseguinte, a priori.” REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4, p. 378.
[16] Como já foi dito, o paradigma kantiano de racionalidade científica se baseia tanto na lógica, na matemática e na ciência da natureza (física moderna de Galileu e Newton) como na sua revolução copernicana, com a crítica prévia.
[17] Cf. CHAUI, Marilena. Convite à filosofia, p. 78. WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p.15.
[18] CHAUI, Marilena. Convite à filosofia, p. 345 (grifo da autora).
[19] WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p.16.
[20] OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 150.
[21] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, prólogo, p. 18.
[22] CHAUI, Marilena. Convite à filosofia, pp. 345-346 (grifo da autora). “— E o que diz esta lei moral? — Uma vez que ela é anterior a toda e qualquer experiência, ela é “formal”. Isto significa que ela não está ligada a um grupo específico de opções na esfera da moral. Ela vale para todas as pessoas, em todas as sociedades, em todos os tempos. Ela não diz, portanto, o que você deve fazer nesta ou naquela situação. Ela diz como você deve se comportar em todas as situações” GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia, p. 357.
[23] Cf. OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, pp. 148-149.
[24] Cf. WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, pp. 27-28.
[25] Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, primeira seção.
[26] WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 28.
[27] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 38.
[28] Idem, pp. 39 e 42.
[29] OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 133. “A legislação da razão humana – filosofia – tem dois objetos, a natureza e a liberdade, e abrange tanto a lei natural como também a lei moral, ao princípio em dois sistemas particulares, finalmente num único sistema filosófico.” KANT, Immanuel. Crítica da razão pura, p. 589.
[30] OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 136.
[31] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 44.
[32] “Trata-se, portanto, de mostrar que a razão é suficiente por si só (= como pura razão, sem o auxílio de impulsos sensíveis) para mover a vontade. Aliás, diz Kant, somente nesse caso podem existir princípios morais válidos sem exceção para todos os homens, ou seja, leis morais que tenham valor universal” REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4, p. 379.
[33] Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 45.
[34] Cf. Idem, pp. 45-47. Os imperativos hipotéticos são regras de eficácia: “se queres Y, deves fazer X” ou “se queres Y, é racional fazer X”. Tais imperativos determinam a vontade só sob a condição de que ela queira alcançar determinados objetivos. Assim, são condicionados, pois valem somente “na hipótese de que” se queira tal fim, escolhido subjetivamente. Cf. REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4, p. 379. WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 31. Kant argumenta que, embora a felicidade seja um fim perseguido por todos os seres racionais, ela consiste numa idéia vacilante, imprecisa e insegura (já que nessa idéia se reúnem, em soma, todas as inclinações humanas). O conceito de felicidade é tão indeterminado que, ainda que todo homem a queira alcançar, jamais ele pode dizer o que propriamente deseja e quer (pois o conceito de felicidade é constituído de elementos totalmente empíricos – tirados da experiência). Ora, é impossível que um ser finito possa fazer idéia exata do que propriamente quer e ninguém é capaz de determinar, por um princípio qualquer e com plena segurança, o que realmente lhe faria feliz (para isso seria necessária a onisciência). Portanto, o problema de determinar de forma segura e universal que ação poderá promover a felicidade de um ser racional, é totalmente insolúvel, visto que a felicidade não é um ideal da razão, mas da imaginação. Assim, cabe a cada um procurar a própria felicidade não por inclinação, mas por dever, conforme a lei moral. Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, pp. 26-27 e 46-49. Somente a liberdade de um ser racional em geral, com seus princípios totalmente a priori, pode indicar-nos como nos devemos comportar para tão-somente nos tornarmos dignos da felicidade. Toda esperança tende à felicidade e a liberdade concorda com a possibilidade da felicidade Cf. KANT, Immanuel. Crítica da razão pura, Ideal do sumo bem como fundamento determinante do fim último da razão pura, p. 571.
[35] Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 46. A respeito leia-se a nota 34 acerca da compreensão kantiana em relação à felicidade.
[36] Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 45.
[37] Idem, p. 47.
[38] Cf. WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 30. “As leis morais são universais e necessárias, mas não do mesmo modo que as leis naturais; com efeito, enquanto as leis naturais não-podem-não-atuar-se, as leis morais podem também não atuar-se (em alemão o ser-necessário em sentido naturalista se diz müssen, enquanto a necessidade ou o dever moral se diz sollen): a necessidade da lei natural consiste, portanto, em seu inevitável realizar-se [aquilo que é], a necessidade da lei moral consiste, ao contrário, no valer para todos os seres racionais sem exceção [dever ser]” ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4, p. 379. Kant distingue aquilo que existe de fato daquilo que deve-ser enquanto normatividade moral. Cf. OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 145.
[39] Cf. ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4, p. 381. “Toda ação que toma seus móveis da sensibilidade, dos desejos empíricos, é estranha à moral, mesmo que essa ação seja materialmente boa. Por exemplo: se me empenho por alguém por cálculo interessado ou mesmo por afeição, minha conduta não é moral. Com efeito, amanhã, meus cálculos e meus sentimentos espontâneos poderiam levar-me a atos contrários”. “A moral de Kant” Disponível em http://www.mundodosfilosofos.com.br Acesso em 17 maio 2008, 18:35.
[40] “No caso do ‘imperativo categórico’, articula-se um dever-ser absoluto, isto é, uma exigência absoluta da razão, e esse imperativo foi articulado por Kant de diferentes maneiras” OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 143.
[41] Cf. WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 32. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção.
[42] WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 32.
[43] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 51.
[44] Idem, p. 52.
[45] Idem, p. 59.
[46] Idem, p. 63.
[47] Cf. Idem, pp. 63-64.
[48] Conforme Manfredo, Kant define os seguintes componentes essenciais de uma máxima moral da ação: 1) Possui uma forma universal; 2) Uma matéria – um fim (o ser racional é fim em si mesmo); 3) Todas as máximas devem poder convergir para um possível reino dos fins. Cf. OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 151. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, pp. 66-67.
[49] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 51. WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 32. “Qualquer norma só pode reivindicar validade, portanto, tornar-se critério de máximas de ação, quando diz respeito a todo e qualquer ser racional, quando rompe as barreiras da pura subjetividade, da esfera da particularidade, na direção da universalidade da comunhão. Trata-se, portanto, de testar a universabilidade de uma norma específica” OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 151.
[50] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, primeira seção, p. 30.
[51] WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 34.
[52] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 54.
[53] WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 38.
[54] KANT, Immanuel apud WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 38. O homem, para Kant, bem poderia ser definido como “aquele que pode e deve agir a partir da razão prática incondicionada, sendo, assim, livre”. “Para Kant, é simplesmente impossível uma ‘dedução teórica’ tanto da realidade da razão prática como de nosso conceito de liberdade. Nesse caso, a tarefa da ética está destinada ao fracasso? Para Kant, a saída é a afirmação de que a fundamentação no nível da práxis é de natureza diferente da teoria. O fundamento constitutivo da moralidade ‘é dado’ efetivamente ao homem e nada mais é que o próprio fato da razão prática. Portanto, a razão se prova na ação como prática: a realidade da razão prática e a realidade da liberdade constituem uma ‘experiência fundante’ na vida humana. É a experiência do incondicionado no condicionado: a vontade finita, empírica, sensível, é interpelada pelo incondicionado a tomar posição diante dele. Esse é, para Kant, o único ‘fato da razão pura’ através do qual é dada ao homem a consciência da liberdade e, portanto, a realidade da razão prática” OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, pp. 142-143.
[55] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, pp. 52-54.
[56] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 58.
[57] “Humanidade significa, aqui, racionalidade ou natureza racional. Tratar a humanidade na sua pessoa como fim implica tratar o ser humano ou os seres racionais como fins. Humanidade implica distintas capacidades, como a de agir por meio de princípios incondicionais; a de exercer a liberdade; a de agir de modo não-imediato; a de entender o mundo. [...] Tratar o outro como ‘mero meio’ ou ‘simplesmente como meio’ significa que ele não pode consentir comigo; isso significa manipula-lo.” WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 39.
[58] OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 154.
[59] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 59.
[60] Idem, p. 60.
[61] Idem, p. 61.
[62] Cf. ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4, p. 381. “Somos os autores da lei a que obedecemos. Estamos sujeitos à lei, tão-somente porque somos considerados os autores da lei. Isso é vontade livre ou autonomia. [...] Para uma vontade ser autônoma, ou seja, ser forma legisladora universal, é necessária uma primeira condição: a independência de todo conteúdo empírico (desejos, interesses, etc.)” WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 42.
[63] WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 68.
[64] “A razão relaciona, então, cada máxima da vontade concebida como universalmente legisladora com todas as demais vontades e com todas as ações para com nós próprios, e isso não se dá em virtude de qualquer outro motivo prático ou de qualquer vantagem futura, mas pela idéia da dignidade de um ser racional que não obedece outra lei senão aquela que simultaneamente dá a si mesmo” KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 65.
[65] Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 64.
[66] OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 180.
[67] Idem, p. 156.
[68] Cf. OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 130.
[69] Cf. KANT, Immanuel. Resposta à pergunta: Que é “Esclarecimento”? (“Aufklärung”).
[70] OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 131.
[71] Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, prólogo, p. 13.
[72] KANT, Immanuel. Crítica da razão pura, p. 589.
[73] Idem. Fundamentação da metafísica dos costumes, prólogo, pp. 13-14.
[74] WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 46.
[75] GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia, p. 359-360. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, terceira seção, pp. 84-85.
[76] Cf. OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 142. “Apesar dos louvores ao cristianismo, Kant entende que a tradição cristão tem de legitimar-se diante do espírito crítico da razão moderna. Não dá mais, na modernidade, para deduzir uma moral para o homem enquanto tal imediatamente dos documentos históricos da Bíblia, e muito menos de pretensas experiências imediatas da vontade santa de Deus. A moralidade radica na liberdade, que se autolegisla e que, independentemente de determinações estranhas, é a libertação racional da vontade” OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 141.
[77] “A moral de Kant” Disponível em http://www.mundodosfilosofos.com.br Acesso em 17 maio 2008, 18:35.
[78] A capacidade discursiva da razão pensa o incondicionado para todo condicionado. O incondicionado (coisa-em-si ou númeno) tem, para Kant, dúplice significação: 1) Completude da série das condições, que só pode ser um; 2) Uma causalidade por liberdade, uma causalidade que se determina por si mesma. O acesso ao incondicionado, seja ele uma Idéia da razão (Deus) ou a própria razão, que determina imediatamente a vontade, uma causalidade por liberdade, sem ser determinada por algo externo a ela, só é possível no plano metafísico. O que é a coisa-em-si mesma, não podemos saber, mas só pensá-la como fundamento do mundo dos fenômenos. WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, pp. 18-19 e 45. KANT, Immanuel. Prefácio da 2ª ed. Crítica da razão pura, p. 31. É interessante notar que o título da obra kantiana (“Fundamentação da metafísica dos costumes”) já exprime propriamente o caráter metaempírico da sua ética (para além da natureza e seus fenômenos, fora desse mundo dos determinismos físicos, está a liberdade – a vontade a prioristicamente determinada pela razão).
[79] “Quando ouço dizer que um espírito pouco comum destruiu, pelos seus argumentos, a liberdade da vontade humana, a esperança de uma vida futura e a existência de Deus, tenho curiosidade de ler o seu livro, pois espero do seu talento que faça progredir os meus conhecimentos. Previamente já sei e com toda certeza que nada destruiu de tudo isso, não porque eu julgue possuir provas irrefutáveis destas importantes proposições, mas porque a crítica transcendental, que me descobriu todos os materiais da nossa razão pura, me convenceu totalmente de que se a razão é inteiramente incapaz, nesse campo, de estabelecer proposições afirmativas, tampouco ou ainda menos é capaz de poder sobre tais questões afirmar algo de negativo. Com efeito, de onde irá este pretenso espírito forte extrair o conhecimento de que, por exemplo, não há ser supremo algum? Esta proposição está fora do campo da experiência possível e, por isso, também fora dos limites de todo conhecimento humano”KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura, pp. 541-542.
[80] “Postular alguma coisa significa afirmar alguma coisa que não se pode provar. Por postulado prático Kant entende algo que precisa ser afirmado para a “prática” do homem; para o seu agir e, portanto, para a sua moral. “É moralmente necessário supor a existência de Deus”, dizia ele”. GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia, p. 354.
[81] Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 70-71.
[82] OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 135.
[83] KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, segunda seção, p. 70.
[84] WEBER, Thadeu. Ética e filosofia política: Hegel e o formalismo kantiano, p. 69. KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes, terceira seção, p. 79-81.
[85] OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Ética e sociabilidade, p. 137.

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