sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Hegel: Unificação de Ontologia e Lógica

Miguel Duclós

Trabalho originalmente apresentado para o CHF-UFSC (2007)

1. Kant e o “fim” da metafísica.

Como é sabido, o sistema de Kant deixou uma tarefa intrincada para a posteridade ao reconceituar a metafísica na dissecação detalhada da razão humana que empreendeu, gerando uma revolução divisora de águas na história da filosofia. O autor tinha pleno conhecimento destas implicações, tanto que intitulou um de seus escritos como “Prolegômenos a toda metafísica futura que queria se apresentar como ciência”. Este livro, lançado em 1783, dois anos depois, portanto da primeira edição da Crítica da Razão Pura, de 1781, embora a obra-prima de Kant só tenha se tornado amplamente conhecida a partir dos artigos publicados na imprensa por Schütz, Schultz e Reinhold e a segunda edição, em 1789. Diante da recepção da sua obra, tida como difícil e de uma redação seca e pesada, Kant escreveu os “Prolegômenos”, mudando o método de exposição de analítico para sintético, e buscando assim atingir um público mais amplo, difundindo, de certa forma, o alcance das suas pretensões de estabelecer uma metafísica verdadeiramente científica. Estes prolegômenos são, portanto, como que uma explicação da Crítica, com as mesmas questões tratadas de forma menos detalhada. Desta forma, não é demais acolher neste subtítulo a problemática envolvida também na obra principal.

Na explicação que dá à sua trajetória, no começo deste livro, se encontra a famosa frase em que Kant diz acerca de David Hume que este o “despertou de seu sono dogmático”. Este dogmatismo do Kant pré-crítico pode ser percebido pela sua escolha, como professor, dos manuais de Christian Wolff - importante filósofo que sucedeu Leibniz e foi influente nas educacionais da época. – e Baumgartem Hume atacou um dos fundamentos da razão, a lei da causalidade, e consequentemente, também o dogmatismo metafísico. Pois este aceita como pressuposto, sem questionamento, a idéia de existência de uma realidade acessível à razão, como Deus, alma, mundo, matéria, forma ou substância. A “revolução copernicana” de Kant, contudo, trará uma nova perspectiva para o tratamento destas questões. Antes, considerava-se que o mundo estava em repouso e o sol girava em torno dele, por isso os cálculos astronômicos não coincindiam; Copérnico então considerou o sol imóvel e a Terra móvel, a realizar o giro em torno do astro. Assim como o Sol, a razão também girava em torno do mundo, buscando iluminá-los. Com Kant a razão fica imóvel e o mundo dos fenômenos é por ela iluminado conforme o raio de sua ação. Como sabemos, Kant, na procura por um juízo sintético a priori que confirmasse a metafísica, fez a distinção entre os chamados phaenomena e noumena, ou as coisas tais como aparecem ao sujeito (fenômenos) e tais como são nelas mesmas (coisa-em-si). Este último aparece como um limite inacessível à razão humana.

Kant faz a separação entre o domínio do ser e o domínio do pensar, inaugurando como necessário um novo sentido para a palavra metafísica. As categorias, portanto, são conceitos puros a priori, ou seja, surgem extraídas das coisas, mas impostos por nós mesmos. Kant com isso intenta eliminar o legado do realismo aristotélico, fixando a correlação essencial entre sujeito e o objeto. O objeto do conhecimento só pode ser chamado objeto porque lhe são oferecidas as condições do conhecimento. Os conceitos metafísicos que elencamos, portanto, são impossibilitados por este engenhoso cheque da razão pura. E não somente a filosofia é afetada, mas também a religião, já que está é pensada nos limites da simples razão, como vemos na análise que Kant faz das três provas teológicas – ou seja, racionais da existência de Deus, a ontológica, a físico-teológica e a cosmológica.

Como observa o poeta romântico Henrich Heine[i], com a Crítica da Razão Pura de Kant, a Filosofia se tornava uma questão nacional naquele país. Vários novos pensadores de grande porte brotaram do solo local e, seguindo a linha do mestre, surgiram alguns discípulos que logo se destacaram. Dentre eles ficaram conhecidos os pensadores que deram origem ao amplo e fecundo movimento de pensamento chamado de Idealismo Alemão Pós-Kantiano, com os sistemas de Fichte, Schelling e Hegel. O Idealismo segue uma direção diferente no problema fundamental da metafísica (o que é o Ser? O que é o pensar?). Estes Idealistas lidavam diretamente com o ataque de Kant à metafísica, mas não queriam abrir mão do absoluto. Esta busca pelo incondicionado revela também uma sede de conhecimento não relativo. A busca do absoluto incondicionado torna-se, portanto, um ideal de conhecimento. Como retomar os objetos clássicos da metafísica sem ignorar o ataque kantiano é o mote dos idealistas alemães.

2. Idealistas Alemães

O primeiro deles, Fichte, parte do absoluto e realiza a sua intuição intelectual. Com esta associa o Absoluto com eu, na forma de eu absoluto – não o “eu” empírico, mas o “eu” em geral, da subjetividade geral. [ii]Mas o eu absoluto,.que é aquilo que o absoluto é (o absoluto é o eu), não consiste em pensar, pois o pensar vem depois. Consiste em fazer, consiste numa atividade. A essência do absoluto, do eu absoluto, é para Fichte a ação, a atividade.

Para Schelling “o absoluto está associado à harmonia, à identidade, à unidade sintética dos contrários, àquela unidade total que identifica num seio materno. (…) O absoluto de Schelling é a unidade vivente, espiritual, na qual estão contidas potencialmente todas as diversidades do mundo que conhecemos” (MORENTE, 1967) [iii]. Essa unidade vivente é anterior a tudo e afirma-se como identidade. Há um renascimento de Spinoza, o último grande racionalista, no Idealismo Alemão. O mundo é uma grande substância que é Deus, os seres finitos são determinações desta substância única. No chamado panteísmo, Deus é e está em todas as coisas, e todo finito é determinação que nega esta substância única. Notável é a influência do Deus Sive Natura espinosano em Schelling, e para ele em tudo que existe há uma fundamental identidade; tudo é uma e a mesma coisa; as coisas, por diferentes que pareçam, vistas de um certo ponto, vêm todas fundir-se nesta matriz idêntica de todo ser que é o absoluto: o único que é infinitamente afirmante, infinitamente afirmado e a indiferença de ambos. O Deus-Universo-Todo é, pois, a identidade absoluta da natureza e do pensamento, da matéria e do Espírito. Em Schelling, a diferenciação do Absoluto é o que distingue a Natureza o Espírito. Mas a distinção nunca é dissolve da identidade. A natureza está repletas de espíritos, porém o espírito é a também, a seu modo, natureza. O espinosismo dos idealistas se mistura com o insurgente romantismo alemão. Até mesmo Hegel é debitário de Espinosa ao colocar o problema da unidade, como veremos. Fichte escreve a Schelling, em carta “na sua ausência tornei-me espinosista. Mas para mim a substância não é o todo, mas o Eu”. O idealismo alemão sintetiza o espinosismo com o sistema de Kant. Porém, cada autor pensou esta síntese de maneira própria.

Heine nos diz que Schelling, ao contrário de Fichte e Hegel, não chegou a fixar uma obra que delimitasse de forma definitiva seu sistema. Seus livros, seguindo uma ordem cronológica, delineiam a lenta formação de uma idéia gradual, onde se fixa uma idéia fundamental. Além da filosofia, tem força no pensamento deste autor a poesia, que utiliza de forma fecunda na construção de imagens simbólicas, em detrimento do campo frio da lógica. Talvez neste grau literário de sua obra resida justamente sua força, mas talvez também seja um dos pontos que levou Hegel a se desligar do círculo e romper com o amigo, deixando-o praticamente no ostracismo autoral e partindo para ser uma espécie de “filósofo oficial da Alemanha”, mais tarde, quando professor em Berlim. Vejamos como isso ocorreu. Hegel é um discípulo de Schelling que aos poucos se apropriou do poder do mestre, deixando-o obedecer-lhe e, finalmente, lançando-o na obscuridade.

Encorajado por seus pais a se tornar um pastor, Hegel ingressou no seminário da Universidade de Tübingen em 1788. A influência do luteranismo e da palavra de Cristo permanece em Hegel mesmo durante todo o desenvolvimento de sua trajetória filosófica. De certa forma, isto se deve à sua formação inicial, calcada no contexto histórico, que encontrou um ambiente seminal em Iena, onde também que começou a amizade com personalidades que viriam a se tornar grandes autores posteriormente, como Hölderlin e Schelling. Ali estudava quando se deu a queda da Bastilha, e Hegel logo se tornou um grande entusiasta da Revolução Francesa, da queda da Bastilha, e mais tarde de Napoleão, antes deste se proclamar imperador. A celebração da liberdade como ideal regulador, que já aparece em Kant, permeia também o projeto hegeliano por toda a vida. Quando Napoleão vence os prussianos, na Batalha de Jena, Hegel já estava redigindo uma grande obra de maturidade, a Fenomenologia do Espirito, em 1807. Havia se mudado para esta cidade em 1801, para dar aulas na universidade local. Em Iena se cultivavam a poesia, a arte e a política.

3. Hegel e o rompimento com os idealistas

O prefácio da Fenomenologia do Espírito marca da separação de Hegel com Schelling, o adeus ao romantismo adotado pelos outros idealistas e também o vôo impulsionado pelas aspirações artísticas das experiências estéticas de vanguarda, que criavam uma alternativa ao racionalismo ao possibilitar o “esquecimento de si”. Confronta o idealismo, por considerar que este quer se por contra o mundo por conta de suas deficiências, ou buscar algo melhor que a realidade. Hegel recupera, portanto, traços do realismo em seu sistema idealista. É a ciência do mundo real, o espírito compreendendo-se a si mesmo em sua própria exteriorização e manifestações, que agora deve ser buscado. Hegel é ainda idealista, mas a unificação da Idéia tem sempre um correspondente na multiplicidade da existência. O idealismo realista nunca perde sua ligação com os fatos.

Kant investigara as possibilidades do conhecimento, inaugurando, com isso, uma teoria da percepção; se um objeto se dá, ele tem de ser percebido antes de ser conceito. Hegel, por sua vez, perguntando como toda a experiência humana é possível, responde que a “Fenomenologia do Espírito” (1807) é a própria evolução da consciência no interior do processo histórico. Hegel é o modelo do intelectual puro, de homem lógico, de pensador racional e frio. Quando era estudante, seus colegas o chamavam “o velho”. Sobre este aspecto, é curioso lembrar a sua famosa definição de filosofia na obra Princípios da Filosofia do Direito, de 1821, que coloca a coruja minervina como símbolo da filosofia:

“Quando a filosofia pinta cinza sobre o grisalho, uma forma de vida já envelheceu, e com o cinza sobre o cinza não se pode rejuvenescer, apenas reconhecer; a coruja de Minerva alça seu vôo somente com o início do crepúsculo.”

4. Unificação de Lógica e Ontologia

Hegel esteve envolto na superação da aparente aporia kantiana. Para Hegel, as restrições kantianas nos afastariam do conhecimento especulativo, nos aproximando do senso comum. Hegel pretende continuar o projeto crítico dando, porém uma solução para a incognoscibilidade da coisa-em-si em contraposição do fenômeno. Para instaurar o começo da ciência é necessário a lógica. Sem as categotias do pensamento o conhecimento seria vazio. Elas são o o ponto de partida para descrever o fenômeno. Mas para dar este passo, era preciso livrar-se das perturbações da consciência e com a separação rígida entre o homem que conhece e o mundo a ser conhecido. Estas superações das cisões são como que a grande realização que o sistema de Hegel propõe para conseguir solucionar o problema kantiano. A ciência da lógica pretende a superação da filosofia anterior. Para isto, era preciso uma maneira de unificar a lógica – as categorias do pensamento subjetivo– com a ontologia, as categorias do ser. O estudo do ser não é separado do pensamento. O ser é constituído como pensamento, e o pensamento revela o ser. Apenas o pensamento vazio procura fora de si algum conteúdo. Antes, o objeto era visto como auto-suficiente e o pensamento absorvia impressões de fora. A verdade era a adequação da forma ao conteúdo. Hegel pretendeu dar fim a este impasse, e por isso criticou as dicotomias – como o dualismo cartesiano - e a clássica subordinação do sujeito ao objeto. Isso só foi possível porque, como dissemos, a filosofia de Hegel tem esta tonalidade fortemente sentido racional, expressa na notória fórmula “o real é racional, o racional é real”, Para Hegel ponto de partida de Hegel é o absoluto, e este é identificado com a razão. À pergunta metafísica: que é o que existe? A resposta de Hegel é: existe a razão. Tudo o mais são fenômenos da razão, manifestações da razão.

Mas, a razão em Hegel não é razão estática, inerte, ou uma faculdade captadora de conceitos, subjetiva. A razão é concebida por Hegel como uma potência dinâmica cheia de possibilidades que se desenvolvem no tempo; é como um movimento. Não há na realidade algo que não tenha uma justificação racional. Esta razão que é o absoluto, efetiva através de suas estruturas internos Hegel chama lógica, dando à palavra um sentido até então não habitual. O estudo da lógica mostra que a razão ao desenvolver-se, ao explicitar-se ela mesma, vai realizando suas razões, vai realizando suas teses, logo as antíteses, logo outra tese superior, e assim a razão mesma vai criando seu próprio fenômeno, vai-se manifestando nas formas materiais, nas formas matemáticas, que são o mais elementar da razão; nas formas causais, que são o mais elementar da física; nas formas finais, que são as formas dos seres viventes, e logo nas formas intelectuais, psicológicas, no homem, na história. Assim, tudo quanto é, tudo quanto foi, tudo quanto será, não é senão a fenomenalização, a realização sucessiva e progressiva dos germes racionais, que estão todos na razão absoluta.

O fundamento do ser é também um vir a ser e isso o faz conseqüência, produto, efeito. Por outro lado, o que faz a conseqüência, o que produz, o que causa, também é mediado enquanto origem através do que realiza. A mediação não se apresenta senão pela imediação. A imediação, por sua vez, não escapa da mediação, pois adquire sua expressão na sua manifestação ou no seu acontecer. Pode-se indicar aqui que em Hegel há uma insuficiência do que é em si que busca sua satisfação no reconhecimento da própria insuficiência.

O sistema de Hegel inaugurado na Fenomenologia e exposto na Enciclopédia tem esta aspiração de totalidade, de dar conta dos diversos ramos do saber. O objetivo de Hegel é captar aas ciências uma unidade orgânica que, com o poderoso recurso da dialética, anima em seu movimento interno as partes necessárias de um todo, que é a filosofia. O objeto de Hegel neste aspecto não é ode de ditar normas ao real, mas descrevê-lo. Na obra que condensa o sistema, a Enciclopédia das Ciências Filosóficas: em Compêndio, ele afirma, no parágrafo 15:

"Cada parte da filosofia é um todo filosófico, um círculo que se fecha sobre si mesmo mas no qual a idéia filosófica vive numa determinação particular".

Apesar da lógica da circularidade que é subjacente ao sistema, existem contudo partes, que, só são inteligíveis na sua referência ao todo mas, por outro lado, é justamente por ser partes do todo que ganham uma necessidade e uma legitimidade que não teriam enquanto individualidades autônomas. A exposição da constituição da idéia é um tema da Lógica. O sistema como um todo tem três partes, e cada parte segue a lei ternária. Cada verdade, cada realidade, tem três aspectous ou estágios. O primeiro passo é a afirmação preliminar e a unidicação, o segundo é a negação e a diferenciação, e o terceiro e final é síntese. Por exemplo, a semente da planta é a unidade inicial da vida que, quando encontra solo apropriado, desconstitui—se e, ainda em virtude de sua unidade vital, mantém estes elementos divergentes uníssonos, para reaparecer como a planta que tem seus membros unidos organicamente. A indução também segue as mesmas etapas, com a hipótese original unifica-se o fato, mas é dissolvida quando confrontada com fatos opostos. O conhecimento científico só avança quando a unificação original se torna forte a tal ponto que reunifique os fatos discordantes.

5. Conclusão: Chegando ao Absoluto.

Kant escreveu o famoso ensaio “O que é o esclarecimento?” (Aufklarung) Um reflexo desta ênfase kantiana no iluminismo, no poder da razão como luz natural, sentimos na afirmação devastadora de Hegel no prefácio da Fenomenologia do Espirito, que encontrou um alvo certeiro de Schelling:

Aqui, considerar um ser-aí qualquer, como é no absoluto, não consiste em outra coisa senão em dizer que dele se falou como se fosse um certo algo; mas que no absoluto, no A=A, não há nada disso, pois lá tudo é uma coisa só. É ingenuidade de quem está vazio de conhecimento pôr esse saber único - de que tudo é igual no absoluto - em oposição ao conhecimento diferenciador e pleno (ou buscando a plenitude); ou então fazer de conta que seu absoluto é a noite em que "todos os gatos são pardos", como se costuma dizer.

Ou seja, um absoluto estático, indiferenciado, onde tudo é igual Hegel procura combater isso ao colocar o movimento e a diferenciação no tratamento da questão. Para Hegel, a solução de Schelling de uma “intuição intelectual” que chega ao Absoluto não é satisfatória. É o percurso da consciência que busca chegar ao Absoluto.

O Absoluto de Hegel está em movimento. A experiência da consciência está em movimento, fazendo o percurso que leva ao Espírito em movimento. O absoluto é o Espírito na relação piramidal com a lógica e a Natureza. O Espírito é o princípio de todo o sensível (a lógica) e do ser (a natureza). Mas é apenas no desenvolvimento de si mesmo e como objeto de si mesmo, que o Espírito se dá a conhecer. As grandes figuras do Espírito são o direito, a moral, a vida social política, a arte, a religião e a filosofia. Estes são evocados como uma auto-diferenciação em relação à identidade com o Absoluto. O Espírito, que não se constrói em seus atos, revela-se sempre vivo no coração dos seus sistemas.

A realidade efetiva do sujeito vai ficar dependendo da consciência de si; o sujeito que se apreende a si mesmo, se apreende como conceito: a pessoa tem que ser um conceito existente, desde que o sujeito seja pensado como “Geist” (Espírito), que seja visto pelo que ele sabe dele mesmo. Hegel estava interessado na historicidade da vida do Espírito. Ao longo de toda essa conquista de si, a qual implica o desenvolvimento da religião, do trabalho, da arte, da cultura, da política etc.; para que haja história, cujo desenrolar contínuo alcança o Saber Absoluto, é preciso que o Espírito se desenvolva a partir do seu próprio conceito.



6. Bibliografia Consultada:

6.1. Autores:
KANT, I. Crítica da Razão Pura. Trad. Manuela Pinto dos Santos e Alexandre Fradique Morujão.. Ed. Fundação Calouste Gulbenkian. Lisboa: 2001
______. Prolegómenos a Toda a Metafísica Futura. Trad. Artur Mourão. Edições 70, Lisboa, 1988.
HEGEL, F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas, Trad, Paulo Meneses, São Paulo: 1995. Ed. Loyola
______ Fenomenologia do Espírito. Trad. Paulo Meneses. Petrópolis: Vozes, 1992.

6.2. Comentários
HEINE, H. Contribuição à História da Religião e Filosofia na Alemanha, Editora Iluminuras; Trad. Márcio Suzuki. São Paulo.
MORENTE, M. Fundamentos de Filosofia. Trad. de Guillermo da Cruz Coronado. Ed. Mestre Jou. Sâo Paulo, 1967.

6.3. WebSites:
http://www.consciencia.org/logica_hegel_roberto.shtml
http://www.educ.fc.ul.pt/hyper/enciclopedia/cap3p7/romantico.htm
http://www.marxists.org/reference/archive/hegel/help/hegelbio.htm
http://en.wikipedia.org/
http://fr.wikipedia.org/
http://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/dc_2_9.htm
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-40141989000200003&script=sci_arttext
http://plato.stanford.edu

6.4. Anotação das Aula da Profª Maria de Lourdes Borges. UFSC - Segundo Semestre de 2007.
...

[i] Contribuição à História da Religião e Filosofia na Alemanha, Editora Iluminuras; Trad. Márcio Suzuki. São Paulo. pg. 100 e ss

[ii] Heine conta uma anedota acerca da dificuldade em compreender o conceito de “Eu” em Fichte: “’Que desaforo!!,’ gritava a boa gente, ‘esse homem não acredita que existimos, que somos muito mais corpulentos do que ele e que temos autoridade sobre ele, como prefeitos e funcionários!’. As senhoras perguntavam: ‘Não acredita ao menos na existência de sua esposa? Nâo? E a senhora Fichte aceita isso?”. Heine, op. Cit. Pg. 102.

[iii] Seguimos a exposição de Morente, cap XIX, na confecção desta pequena síntese de Fichte e Schelling. (ver Bibliografia).

domingo, 24 de fevereiro de 2008

O Personalismo cristão como possível fundamentação para a bioética

Texto apresentado na VIII Semana de Filosofia – Centro de Ciências e Humanidades da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Por: Adriano de Araujo

De todas as concepções humanas a mais decepcionante é aquela herdada do empirismo materialista cujo maior efeito é a promoção de um abastardamento da espiritualidade humana em prol da sua individualidade material.

Desde Hobbes, Locke, Hume, em seguida, Darwin, Spencer, Marx, Freud, entre muitos outros que poderíamos mencionar; é que gradativamente verificou-se que a inteligência e a vontade humana, de modo muito variado, restringiu-se ao campo do material-sensível perdendo o seu senso real. Afinal, em nenhum outro momento da história, como o nosso, ouviu-se tantos clamores exigindo a condição de estrita animalidade para o homem.

Por conseguinte, é com um certo estranhamento e espírito inquietante que nos questionamos: Será que não passamos de macacos sem pêlos impelidos pela libido e bem sucedidos na história?… Será que a inteligência e a vontade devem permanecer no nível da sensibilidade irracional?… Será que devemos nos figurar reduzidos apenas a um complexo físico-químico ou a um material orgânico bem desenvolvido no espaço e no tempo?… Como é possível sustentarmos a dignidade da pessoa humana, sua espiritualidade, inviolabilidade, integridade e intimidade diante do exagero da materialidade individual que se faz tão presente?…

Certamente o personalismo cristão vai ao encontro de tais questionamentos e inquietações suscitando a harmonia entre a individualidade material e a personalidade espiritual. Como também, fornece uma visão do homem que transcende as determinações do mundo físico, promovendo fundamentos para a emergência de uma “ética da vida”, que é o caso da bioética.
Acerca do Indivíduo e da Pessoa

No personalismo cristão considera-se o ser humano metido em dois pólos: um pólo material que explicita sua individualidade, e outro pólo espiritual que explicita sua personalidade. Eis-nos diante de dois aspectos reais do ser humano que estão correlacionados e devem ser bem compreendidos.

A individualidade fundamenta-se sob condições materiais, isto é, em que haja determinada indeterminação determinável; afinal, é necessário considerar que a matéria “… exige para ocupar no espaço uma posição distinta de uma outra posição…”, “… pois é uma espécie de não ser, uma simples potência de receptividade e de mutabilidade substancial, uma avidez para o ser”.[1]

E tomado apenas pela sua individualidade, o homem tende a dispersar-se no múltiplo, tende a desestruturar-se no espaço e no tempo, pois “a matéria tende de si mesma para se decompor, como o espaço para se dividir” [2]; em outras palavras, como indivíduo, o homem permanece submetido ao determinismo do mundo físico, pois, em tal condição, é parte de uma totalidade e jamais é uma totalidade única; afinal, o indivíduo sempre se compõe e decompõe na totalidade física, como por exemplo, o fruto que se compõe como parte da árvore e ao separar-se dela, se decompõe e torna-se parte de outra coisa.

Porém, enquanto material que é, o indivíduo exige e ostenta uma energia metafísica que sirva de sustentáculo da sua existência, o que, no caso do homem, é a própria alma espiritual, ato primeiro de vida subsistente; ou seja, aquilo que resguarda sua unidade substancial, a sua estrutura espaço-temporal, a sua totalidade única; e que determina ou especifica sua materialidade individuante.

Ao nos depararmos com a alma espiritual é que reconhecemos aquele princípio de unidade criadora, de independência e liberdade; ou seja, que reconhecemos a pessoa humana que somos. Com efeito, em contrário ao pensamento de muitos, enquanto pessoas humanas, possuímos integridade, já que somos uma totalidade única irredutível a qualquer outra totalidade; significa que: “… as pessoas não são intercambiáveis, não são indivíduos numéricos: não são como os frangos. “Tenho três galinhas” não tem o mesmo conteúdo que “tenho três filhos”, ainda que coincidam quantitativamente” [3].

A personalidade torna manifesto o centro metafísico do homem, a sua espiritualidade, aquela fonte última da dignidade que expressa sua inviolabilidade na existência. E é pelo ato de intensividade variável, em que o enriquecimento da assimilação exterior cresce na mesma medida em que cresce a vida imanente; como também, na tendência a realizar tal crescimento que identificamos o dinamismo próprio da pessoa humana; ou seja, que identificamos aquela similitude divina em nós, que é a inteligência e a vontade.

A inteligência e a vontade são as faculdades imateriais e espirituais intrínsecas à personalidade humana, pois são subsistentes e garantem nossa superioridade diante de outros seres vivos. Como também, são faculdades que pela condição de imaterialidade são imensuráveis organicamente, o que conseqüentemente torna o homem, enquanto pessoa, livre das diversas determinações do mundo físico, caracterizando a sua própria intimidade. “A intimidade indica um dentro que só a própria pessoa conhece” [4], e certamente tal intimidade, esse abrir-se para dentro, legitima sua inviolabilidade espiritual; afinal, ela indica o que somos interiormente, trata-se de nosso patrimônio pessoal que somente é revelado ou comunicado a outros se quisermos.

Importa ressaltar que a individualidade e a personalidade não existem separadas no homem, pois são dois pólos complementares, e constituem a condição necessária da nossa existência no mundo físico.

Entretanto, é em ordem à personalidade que a individualidade se torna melhor. “Porque sem dúvida, cada um dos meus atos é ato de mim indivíduo e ato de mim pessoa; mas na medida em que é livre e me compromete inteiramente, cada um dos meus atos é arrastado num movimento que vai para o centro supremo para que tende a personalidade, ou num movimento que vai para a dispersão onde, entregue a si mesma, a individualidade material exige recair” [5].

Assim, como pessoas, sempre somos livres para nos entregarmos aos movimentos da própria individualidade material, a tal ponto que nos representamos ou nos tornamos camelos de si próprios ou macacos sem pêlos impelidos pela libido e bem sucedidos na história; e até, mesmo que isso seja contraditório, negamos a inteligência e a vontade reduzindo-as à sensibilidade irracional. Em outros termos, o homem só pode negar a vida do espírito, porque é espiritual, porque é pessoa humana. Eis a sua condição de liberdade!…
A Bioética e o Personalismo Cristão.

Na maioria das vezes considera-se a bioética apenas como uma “ética aplicada” num sentido absolutamente pragmático, isto é, como se houvesse o primado da ação sobre a inteligência, em que a inteligência fosse incapaz de conhecer o real; sendo o real apenas um bom resultado.

Na verdade, perante as emergências atuais provenientes do progresso técnico-cientifico a significação real da bioética possui um alcance muito maior, pois é “ética da vida”; é o que podemos verificar nas palavras de Leo Pessini: “… ela vem ganhando uma visibilidade, uma urgência toda especial na nossa sociedade contemporânea, justamente porque nós temos fatos, acontecimentos e progressos extraordinários no âmbito da ciência, na nossa ciência da vida e da saúde que estão querendo alterar tudo no que se refere à vida na face da terra e do ser humano em particular; daí a importância de que as novas gerações, a juventude universitária de hoje esteja atenta, justamente às questões éticas implicadas nesse progresso técnico-cientifico” [6].

Portanto, enquanto “ética da vida”, a bioética possibilita e favorece todo um resgate da ética cósmico-realista da tradição clássica tão presente no personalismo cristão, a qual é metafísica e “fisicamente” fundada. Pois nela verifica-se todo um interesse em conhecer e direcionar-se para a situação do homem no mundo e as suas realidades extramentais, sempre considerando o progresso técnico-cientifico.

E ao apossar-se da bioética como “ética da vida” também nos afastamos daquela ética acósmico-idealista regida por meio de postulados ditados por uma pseudo-razão onde é predominante certa condição dedutivo-normativo. Afinal, todo conhecimento originado de tal progresso deve ser bem sustentado eticamente. Pois, “o que vai definir o uso desse conhecimento, dessa energia para o bem ou para o mal é uma opção ética, por isso que a ética tem que estar estritamente ligada com a questão cientifica e técnica” [7].

Não há dúvidas que a prioridade da bioética está em preservar a integridade e dignidade da pessoa humana no mundo, isto é, diante de tantos avanços científicos e técnicos. E nada mais adequado que explicitarmos e reconhecermo-nos mais como pessoas do que como indivíduos, ou seja, em submetermos nossa individualidade material à personalidade espiritual.

Certamente quando nos identificamos como pessoas passamos a respeitar a pessoa do outro, nos tornamos mais dignos da verdadeira condição humana; entretanto, ao nos identificarmos apenas como indivíduos passamos a oprimir o outro e ignoramos a nossa própria dignidade, e mesmo enquanto humanos preferimos nos representar ou agir como animais.

Sendo assim, é elevando a condição de pessoa humana que o personalismo cristão pode respaldar ou fundamentar a bioética que perpassa todos os âmbitos da vida.
__________
Referência bibliográfica

· MARITAIN, Jacques. A pessoa e o bem comum. Lisboa: Livraria Moraes Editora, 1962.

· STORK, Y. Ricardo, ECHEVARRÍA, A. Javier. Fundamentos de Antropologia. São Paulo: Ed. Instituto Brasileiro de Filosofia e Ciência Raimundo Lúlio, 2005.
Referência de consultas

· Entrevista concedida no “I Congresso de Bioética” realizado na Universidade Presbiteriana Mackenzie em 2007.

[1] Cf. MARITAIN, Jacques. A pessoa e o bem comum. Lisboa: Livraria Moraes Editora, 1962. p. 37.

[2] Cf. Idem. Ibidem. p. 39.

[3] Cf. STORK, Y. Ricardo, ECHEVARRÍA, A. Javier. Fundamentos de Antropologia. São Paulo: Ed. Instituto Brasileiro de Filosofia e Ciência Raimundo Lúlio, 2005. p. 87.

[4] Cf. Idem. Ibidem. p 83.

[5] Cf. MARITAIN, Jacques. A pessoa e o bem comum. Lisboa: Livraria Moraes Editora, 1962. p. 45.

[6] Entrevista concedida no “I Congresso de Bioética” realizado na Universidade Presbiteriana Mackenzie em 2007.

[7] Ibidem

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Marx, o manifesto e suas idéias (1818-1883) [1]

Jéferson dos Santos Mendes[2]

Hoje, quase um bilhão de seres humanos são instruídos numa doutrina que, com ou sem razão, se denomina marxismo. Uma determinada interpretação da doutrina de Marx se transformou na ideologia oficial do Estado russo, e em seguida dos Estados da Europa oriental e do Estado chinês.[3]

A história de toda a humanidade se resume para Marx e Engels na história da luta de classes[4] onde há um enfrentamento constante entre uma classe que é dominante e outra que é dominada, “Homem livre e escravo, patrício e plebeu, senhor e servo, mestre e oficial, em suma, opressores e oprimidos sempre estiveram em constante oposição; empenhados numa luta sem trégua, […]” (MARX, 2002, p. 23).

Para Marx a sociedade moderna não substitui a luta de classes apenas trocou de classes antigas por novas, novas condições de opressão da mesma forma novas formas de condições de luta. Nessa época da burguesia a sociedade cada vez mais caminha para dois grandes blocos inimigos: o proletariado e a burguesia,[5] tendo passado para Marx e Engels por um longo processo de desenvolvimento, pelos diferentes modos de produção.[6] Tendo em vista o vertiginoso papel fundamental que ocupou a burguesia ao longo da história.

Segundo Marx a burguesia destruiu todas as relações, sejam feudais, patriarcais, idílicas, transformando em um puro interesse pelo dinheiro,[7] resumindo “[…] pela exploração, aberta, cínica e brutal” (MARX, 2002, p. 28).

Dessa forma, “A burguesia rasgou o véu de emoção e de sentimentalidade das relações familiares e reduziu-as a mera relação monetária”. (MARX, 2002, p. 28). A burguesia para Marx é uma das causas das destruições entre os homens, dessa forma a burguesia não pode existir sem “revolucionar os instrumentos de produção; portanto, as relações de produção; e assim o conjunto das relações sociais”.[8] Assim, o que era antigo deixa de existir sendo constantemente transformado, Marx expõe sua famosa frase “tudo o que era estável e sólido desmancha no ar; […]”.[9]

Pressionada pela necessidade de mercados sempre mais extensos para seus produtos, a burguesia conquista a terra inteira. Tem que imiscuir-se em toda a parte, instalar-se em toda a parte, criar relações em toda a parte.[10]

A burguesia conquista os quatro lados do mundo, vão além fronteiras, pela exploração do mercado mundial, a burguesia levou todos os países à produção e o consumo, as indústrias para Marx que agora são novas indústrias, não adquirem para fazer suas matérias-primas de localidades, mas matérias-primas de outros países e seus produtos acabam sendo levadas para todos os lugares do mundo, antigas necessidades dão lugar a novas necessidades que acabam fazendo parte do consumo e da necessidade de cada indivíduo,[11] nação ou país. Daria para dizer o princípio da globalização, o que Marx chamou de “intercâmbio generalizado”,[12] que gerou uma dependência de nação para nação, para ele isso tanto no que diz respeito às produções materiais e intelectuais, as produções nacionais tornam-se mundiais, a burguesia é responsável por essa “globalização”, pelo civilizacionismo, a burguesia usa dos baixos preços de suas mercadorias para que mesmo “[…] os bárbaros xenófobos mais renitentes a capitularem”. (MARX, 2002, p. 30).

A burguesia opera de forma que todas as nações, todos os indivíduos adotem o modo de produção burguês, dessa forma, “[…] plasma um mundo a sua própria imagem” (MARX, 2002, p. 31). A burguesia subjugou populações a outras, criou “cidades tentaculares”, que tiram pessoas dos campos que aumentam as populações das cidades, povos bárbaros ou semi-barbáros estão subjugados a povos mais civilizados, dessa maneira, “A burguesia controla cada vez mais a dispersão dos meios de produção, […]” (MARX, 2002, p. 31). Portanto, a burguesia centralizou a propriedade em poucas mãos, com isso, acabou sendo ou melhor dizendo ocorrendo à centralização política,[13] Marx considera que a burguesia conseguiu adquiri uma imponência tal que nem todas as gerações anteriores juntas conseguem o que ela fez em apenas um século,

O domínio das forças naturais, o maquinismo, as aplicações da química à indústria e à agricultura, a navegação a vapor, as ferrovias, o telegrafo, o desbravamento de continentes inteiros, a canalização de rios, o aparecimento súbito de populações – em que século anterior se poderia prever que tais forças produtivas cochilavam no seio do trabalho social?[14]

Marx reconhece que as bases da formação burguesa iniciam ainda com o sistema feudal, com os meios de produção e de troca, onde foram substituídas pela livre concorrência, assim com a organização social e política, portanto com a supremacia econômica e política da classe burguesia.

A crise de superprodução é vista por Marx, como crises sucessivas, porque? Devido a “Civilização em excesso, meios de subsistência em excesso, indústria em excesso, comércio em excesso” (MARX, 2002, p. 34). As forças produtivas não mantém a civilização burguesa, essas se tornam forte demais e acabam sendo estravadas, o que leva a sociedade burguesa a cair no caos e na desordem, colocando em risco a própria sociedade burguesa. “As relações burguesas tornaram-se estreitas demais para conterem a riqueza que produziram” (MARX, 2002, p. 34).

Dessa maneira, existem duas formas da burguesia superar as crises, uma entra dentro do aniquilamento forçado de um enorme contingente de forças produtivas; e o outro pela conquista de novos mercados sem deixar de explorar os mais antigos. Assim, Marx define que das mesmas armas que a burguesia usou para bater o feudalismo, essas se voltam agora contra ela, porém não foram apenas às armas que esta burguesia criou para sua própria destruição, criou também os homens que empunharão as armas “os operários modernos, os proletariados” (MARX, 2002, p. 34).

O desenvolvimento da burguesia segundo Marx assim portanto do capital[15] corresponde segundo ele ao desenvolvimento do proletariado, estes que “[…] só sobrevivem à medida que encontram trabalho, e só encontram trabalho à medida que seu trabalho aumenta o capital” (2002, p. 35). Estes portanto, o proletariado não passa de mercadoria como qualquer outra, por este fato estão sujeitos “[…] a todas as flutuações do mercado” (MARX, 2002, p. 35).

Com a extensão do maquinismo e da divisão do trabalho, o trabalho perdeu todo o caráter de autonomia e, assim, todo atrativo para o operário. Este se torna um simples acessório da máquina. Só lhe exigem o gesto mais simples, mais monótono, mais fácil de aprender. Portanto, os custos que o operário gera limitam-se aproximadamente apenas aos meios de subsistência de que necessita para manter-se e reproduzir-se. Ora, o preço de uma mercadoria – e, portanto, também do trabalho – é igual a seus custos de produção. Por conseguinte, à medida que o trabalho se torna mais repugnante, o salário decresce. Mais ainda, à medida que o maquinismo e a divisão do trabalho aumentam, cresce também a massa do trabalho, seja pelo aumento do trabalho exigido em determinado lapso de tempo, seja pela aceleração do movimento das máquinas, etc.[16]

Marx cita que as pequenas fábricas de artesões se tornaram grandes fábricas, gerando grandes capitalistas. Quanto aos operários, Marx compara-os a soldados, devido a sua forma de organização dentro das fábricas; buscando o fim último para o burguês o lucro, que não existe a diferença entre sexos, mulheres e crianças, o que resta são apenas, “instrumentos de trabalho”. Dessa forma, entende que “O proletariado passa por diversas etapas de desenvolvimento. Sua luta contra a burguesia começa com o nascimento” (MARX, 2002, p. 37). Entende Marx, que o proletariado já nasce proletariado, na realidade Marx não vê no sistema burguês ou capitalista, mobilidade social, se o proletariado começa a sua luta contra o burguês já no seu nascimento.

Inicialmente operários entram em luta isoladamente; em seguida, operários de uma mesma fábrica; depois, operários de um setor industrial, em um mesmo local, contra um mesmo burguês, que os explora diretamente. Dirigem seus ataques não somente contra as relações burguesas de produção; dirigem-nos também contra os próprios instrumentos de produção; destroem as mercadorias estrangeiras concorrentes, quebram máquinas, incendeiam fábricas, procuram reconquistar a posição desaparecida do artesão medieval.[17]

Marx então vê que, quando existia o artesão industrial não havia uma desigualdade latente e tão generalizada, aberta e cínica por parte da burguesia por fim os operários formariam uma massa em todo o país dividida apenas pela concorrência deles mesmos, essa união que é fruto da burguesia que usa do proletariado para atingir os seus interesses e seus objetivos políticos, dessa forma, os proletariados “[…] não combatem seus inimigos, mas os inimigos de seus inimigos […]” (MARX, 2002, p. 38). Estes que seriam remanescentes da monarquia absolutista, burgueses não-industriais, daí para Marx “[…] todo movimento histórico concentrasse nas mãos da burguesia” (MARX, 2002, p. 38). A vitória é alcançada pela mesma.

Mas, com a expansão da indústria, o proletariado não somente cresce; concentra-se em contingentes cada vez maiores; sua força cresce, com o sentimento que dela adquire. Os interesses, as condições de vida no seio do proletariado homogeneízam-se cada vez mais, à medida que o maquinismo oblitera as diferenças do trabalho e quase em toda a parte reduz os salários a um nível igualmente baixo. A concorrência crescente dos burgueses entre si e as crises comerciais que daí resulta do salário dos operários sempre mais instáveis. O aperfeiçoamento incessante e sempre mais rápido do maquinismo torna sua situação cada vez mais precária. Cada vez mais, conflitos isolados entre operários e burgueses assumem o caráter de conflitos entre duas classes. Os operários começam por formar coalizões contra os burgueses; unem-se para defender seu salário. Chegam até a fundar associações duradouras para se premunirem em caso de sublevações eventuais. Aqui e ali, a luta transforma-se em motins.[18]

Marx cita que os operários triunfam mais é um triunfo passageiro, o resultado é o aumento de sua união, que aumenta também pelos meios de comunicação, que é criado pela grande indústria, ocorrendo lutas por toda a parte, luta de classes, “Mas toda luta de classes é uma luta política” (MARX, 2002, p. 39). Aí Marx atribui ao homem conceito de ser político por natureza de Aristóteles, por três vieses quando entende por uma luta de classes toda a história da humanidade, segundo que a luta do proletariado contra o burguês começa do nascimento e por último que a luta de classes é portanto uma luta política. Provavelmente, estaria se referindo ao direito político, que uma classe sempre sobrepujou outra a não possuir.

Depois de formados em classe o proletariado forma-se em partidos políticos, porém acaba sendo alterada pela concorrência dos próprios operários, mas permanece voltando, cada vez mais forte. Como cita Konder “A burguesia teme a ascensão do proletariado […]” (1998, p. 78).

Os interesses burgueses entram em conflito com seus próprios interesses;[19] Marx acredita que em determinado momento uma burguesia consciente do problema do proletariado se unira a eles, uma burguesia ideólogo. Marx afirma que de todas as classes que enfrentaram a burguesia, a classe do proletariado é uma classe revolucionária, sendo as outras levadas ao desaparecimento com o desenvolvimento da indústria.

As classes médias – o pequeno industrial, o pequeno comerciante, o artesão, o camponês -, todos combatem a burguesia para preservar do desaparecimento sua existência como classes médias. Portanto, não são revolucionárias, pois procuram girar a contrapelo a roda da História. Quando são revolucionárias, o são à luz da perspectiva iminente de sua passagem para o proletariado. Defendem não mais seus interesses presentes, mas seus interesses futuros; abandonam seu próprio ponto de vista para assumir o do proletariado.[20]

Toda a situação que leva o proletariado a vender-se, “O proletariado não possui nada; […]” (MARX, 2002, p. 42), Marx entende que a submissão do proletariado ao capital moderno é o mesmo em toda a parte, dando exemplo de Inglaterra, França, América e Alemanha, e que leis, religião e a própria moral são preconceitos burgueses, na verdade esses apenas camuflam seus interesses.

Para que o proletário consiga a sua vitória ou conquista, ele deve primeiro expropriar todas as condições do passado, a luta do proletariado contra a burguesia, primeiro é uma luta nacional, segundo os proletários de cada país devem acertar as contas com suas burguesias, segundo as fases da dominação, primeiro a guerra civil, depois a revolução aberta, com o proletariado lançando as bases de sua dominação, incorrendo com a derrubada da burguesia.[21]

A sociedade não pode mais existir sob o domínio da burguesia, pela incapacidade que essa tem de mantê-la, a base da classe burguesa Marx define como a riqueza nas mãos privadas e a formação e incremento do capital. Sendo que a condição para a existência do capital é o trabalho assalariado, a concorrência entre os operários. Assim, “A burguesia produz, acima de tudo, seus próprios coveiros” (MARX, 2002, p. 54), a sua queda, quanto à vitória do proletariado é para Marx algo inevitável.[22]

Na segunda parte do livro Marx expõe a relação dos comunistas com os proletariados, os comunistas para Marx diferenciam em dois aspectos dos outros partidos proletários: um pelo fato de estabelecer uma relação comum de interesses entre os proletários, portanto não desenvolve um pré-conceito nacionalista; em segundo, sempre representou o interesse do movimento em geral. Assim, os comunistas passam a ser a fração mais decidida entre os partidos proletários, pois manifestam suas vontades e interesses das massas, para Marx possui uma visão clara de objetivos, dessa forma, “O objetivo imediato dos comunistas é o mesmo de todos os demais partidos proletários: formação do proletário em classe, derrubada da dominação burguesa, conquista do poder político pelo proletariado” (MARX, 2002, p. 47).

Marx resume a teoria comunista em “supressão da propriedade privada”, vem à pergunta qual propriedade Marx esta falando? Responde não ser a propriedade dos pequeno-burgueses que estão perdendo dia a dia graças à industrialização a sua propriedade, para Marx, o que o proletariado ganha não dá possibilidade alguma de ter uma propriedade. Só tendo condições de ter propriedade quem explora o trabalho assalariado que cria o capital. Portanto, a propriedade gravita em torna do trabalho assalariado e do capital. O capital é um produto coletivo, sendo apenas possível a sua mobilização através da participação de inúmeros membros. Se o capital for transformado em um bem coletivo, dessa forma, que pertença a todos os membros dessa sociedade, a propriedade perde o caráter de classe.

O que Marx diz do trabalho assalariado, que o preço médio do trabalho assalariado é o salário mínimo, “A soma dos meios de subsistência necessários para manter vivo o operário enquanto tal” (MARX, 2002, p. 49). Dessa forma, o que o operário adquire por meio do trabalho apenas mantém a sua sobrevivência ou mesmo ajuda a garanti-la.

Na sociedade burguesa, o trabalho vivo é apenas um meio para multiplicar o trabalho acumulado. Na sociedade comunista, o trabalho acumulado é apenas um meio para aumentar, enriquecer, fazer avançar a existência dos operários.[23]

Marx procura dessa forma, atingir tudo com a proposta de supressão, a família para Marx só existe para a burguesia e esta repousa no capital e no lucro privado, portanto deve ser suprimida. A educação também deve ser modificada não mais uma educação familiar, mas uma educação social.[24] A ânsia pelo capital faz com que a burguesia explore até mesmo suas mulheres, transformando-as em meros instrumentos de produção.[25]

Para Marx toda a história girou em torno da oposição de classes, dessa forma a revolução comunista é a forma mais radical de rompimento com as relações tradicionais. O proletariado depois de acender ao poder devera suprimir todo o capital burguês, pondo todo nas mãos do Estado, na verdade dos proletariados organizados como uma classe dominante para também aumentar o contingente das forças de produção.[26]

À medida que desaparece a diferença entre as classes, o poder público acaba perdendo o seu caráter político. Dessa forma, ocorrendo à supressão da diferença entre as classes. Porém, “É impossível colher uma rosa sem espinhos!” (MARX, 2006, p. 60).

Por fim, Marx examina as concepções socialistas, nega as concepções de Saint-Simon, Owen, Fourier, etc. que segundo Marx rejeitam a ação política, portanto, o modo revolucionário. Buscam seus objetivos por vias pacíficas.

A Alemanha estaria para Marx às vésperas de uma revolução burguesa, o proletariado estaria mais desenvolvido, do que na França e na Inglaterra.

Por fim, Marx lança a sua proclamação, de que os proletariados não têm nada a perder a não ser “os seus grilhões”, dessa maneira única forma de atingirem os seus objetivos é pela união.

BIBLIOGRAFIAS:

ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. Tradução Sergio Bath. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes.

Homem e sociedade: leituras básicas de sociologia em geral [organização e introdução de] Fernando Henrique Cardoso e Octavio Ianni. 11. ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1977.

KONDER, Leandro. Marx: vida e obra. Expressão popular, 1998.

MARX, Karl. Liberdade de Imprensa. Tradução de Claudia Schilling e José Fonseca. Porto Alegre: L&PM, 2006.

MARX, Karl. Manifesto do partido comunista / Karl Marx / c/ Friedrich Engels; tradução de Sueli Tomazzini Barros Cassal. Porto Alegre: L&PM.

MARX, Karl. O capital: crítica da economia política. Tradução Reginaldo Sant’Anna. 22. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.

[1] O presente trabalho foi totalmente organizado através do livro: MARX, Karl. Manifesto do partido comunista / Karl Marx / c/ Friedrich Engels; tradução de Sueli Tomazzini Barros Cassal. Porto Alegre: L&PM, 2002.

[2] Professor/tutor na área de História, Geografia, Filosofia e Sociologia, do ensino fundamental e médio do SESI/RS. Pesquisador voluntário no projeto “Estado, Terra e Poder: a questão agrária no judiciário do Planalto Rio-Grandense - República Velha”. E-mail: mendesjeferson@yahoo.com.br

[3] ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. Tradução Sergio Bath. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 186.

[4] Aqui se entende a frase de Marx no Capital, “[…] porque é mais fácil estudar o organismo, como um todo, do que suas células”. Marx, Karl. O capital: crítica da economia política. Tradução Reginaldo Sant’Anna. 22. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004, p. 16.

[5] MARX, Karl. Manifesto do partido comunista / Karl Marx / c/ Friedrich Engels; tradução de Sueli Tomazzini Barros Cassal. Porto Alegre: L&PM, 2002, p. 24.

[6] Idem, p. 26.

[7]Idem, p. 27.

[8] Idem, p. 28.

[9] Idem, p. 29.

[10] Idem, p. 29.

[11] “A maneira pela qual os homens produzem seus meios de subsistência depende, primeiramente, da natureza dos meios de subsistência encontrados e a serem reproduzidos. Esta maneira de produzir não deve ser vista como simples reprodução da existência física dos indivíduos. Trata-se antes de uma espécie já determinada de atividade destes indivíduos, um modo determinado de manifestar vida, sua maneira de viver. A maneira pela qual os indivíduos manifestam sua vida é sua maneira de ser. Sua maneira de ser conjuga-se à sua produção, tanto àquilo que é produzido, como ao modo pelo qual produzem. O que os indivíduos são, portanto, depende das condições materiais de sua produção. In: MARX, Karl. A ideologia em geral. (In) Homem e sociedade: leituras básicas de sociologia em geral [organização e introdução de ] Fernando Henrique Cardoso e Octavio Ianni. 11. ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1977, p. 305.

[12] MARX, Karl. Manifesto do partido comunista / Karl Marx / c/ Friedrich Engels; tradução de Sueli Tomazzini Barros Cassal. Porto Alegre: L&PM, 2002, p. 30.

[13] Idem, p. 31.

[14] Idem, p. 31-2.

[15] Marx é o primeiro autor a se utilizar o termo capital.

[16]Idem, p. 35-6.

[17] Idem, p. 37.

[18] Idem, p. 38-9.

[19] Idem, p. 40.

[20] Idem, p. 41-2.

[21] Idem, p. 43.

[22] Idem, p. 45.

[23] Idem, p. 50.

[24] Idem, p. 54.

[25] Idem, p. 55.

[26] Idem, p. 59.

[BL]filosofia, platão, aristóteles, nietzsche, bacon, maquiavel, descartes, hume, locke, marx [/BL]

Breve comentário sobre a teoria de Thomas Hobbes (1588-1679)[1]

Jéferson dos Santos Mendes[2]

Thomas Hobbes tem importância pela sua teoricidade, vindo sua influência de seus pensamentos. Era um autor inglês cuja obra “Leviatã”, de 1651, é fundamental para o entendimento de seus pensamentos. Hobbes foi o primeiro teórico a adiantar o modelo racionalista - e não o método da autoridade, no interior do estudo do pensamento político.

O Leviatã é considerado uma das obras primas do pensamento político inglês e define o pensamento político moderno, desde o século XVII até os princípios do século XX.

Thomas Hobbes nasceu em 5 de abril de 1588, em Malmesbury (Wiltshire). Não vinha de família abastada, mas era filho de um clérigo semi-letrado. Este acabou tornado-se alcoólatra e abandonando a família. Os custos dos estudos do jovem Hobbes foram garantidos pelo seu tio. Passou primeiro pela escola primária de Malmesbury, e depois num hall em Oxford, sendo desde o princípio visto como um aluno brilhante, principalmente no estudo das letras. Isso acabou levando-o a traduzir algumas obras: Tucídides em 1629, e em 1674 uma tradução de Homero. Tal era a fluência em línguas de Hobbes dominava fluentemente o inglês, italiano, francês e grego.

O Leviatã é um grande homem artificial, de maior força e estatura que um homem natural, sendo idealizado para defesa. Para determinar o homem artificial, primeiro Hobbes considera a matéria e o artífice - que são homem; segundo, como e por meio de que convenção esse é feito, quais são os direitos, o justo poder ou mesmo a autoridade de um soberano, sendo também necessário que se veja o que o preserva e o que o desagrada; em terceiro, a pergunta o que é uma república cristã; quarto, o reino das trevas.

Hobbes, no Leviatã, começa a fazer perguntas que definam as condições de seus tratados, e de suas posições, a primeira pergunta de Hobbes faz referência à justiça natural, da qual segundo ele foi o que tornou seu principal fundamento para uma reflexão mais apurada, o que significava dar a cada um aquilo que é seu. Disto vem a preposição que um homem tem o que é seu, ao invés de ter o que é do outro. Daí Hobbes que conclui que essa idéia não se devia a natureza, mas ao consentimento. Outra pergunta que levanta é, se tudo é igual a todos em comuns, se os bonés forem comuns a todos, por exemplo, haverá controvérsias, principalmente no que diz respeito a quem desfruta de tais bens.

Para Hobbes o homem é movido por apetites e aversões, determinado pelo esforço, portanto pelo prazer e pela dor, dessa maneira sempre procurando maximizar o prazer e minimizar a dor.
O homem sempre se preocupa com a estabilidade do prazer, de que forma este pode premonizar a acumulação de bens que tendem e devem lhe dar ou melhor fornecer prazer. Se a premonição também pode produzir o medo da morte, que é vista por Hobbes como a antecipação de um mau futuro.

O poder para Hobbes é definido em dois propósitos, um de aparência natural e outro de natureza instrumental, o primeiro diz respeito às faculdades do corpo e do espírito, como força, eloqüência, beleza, prudência, capacidade, liberdade. O segundo, são adquiridos seguindo o primeiro, e seguem meios e instrumentos para adquirir mais, exemplos como a riqueza, a reputação, os amigos, e os secretos desígnios de Deus a que os homens chamam boa sorte.

Para Hobbes a competição pela riqueza, a honra, e outras formas de poder é que levam à luta, à inimizade e à guerra, pois a forma do competidor adquirir o que deseja é matar, subjugar, suplantar ou repelir os outros. Na verdade, o homem busca incessantemente sobrepujar os demais.

A raiz das discórdias entre os homens é quando entram em choque os apetites e aversões e o relativismo moral. A primeira segue as vontades individuais, a segunda quanto a questões de certo e errado, dessa maneira entende-se que os desejos dos homens são diferentes, pelo fato de que estes diferem em comportamento, costume e opinião, dessa forma o que é aprovado por uma pessoa e desaprovado por outra, a primeira vê como bem a segunda vê como mal. Portanto, seguirá dessa forma a discórdia e o conflito.

Dessa maneira, a discórdia nasce da comparação das vontades dos homens, e também do apetite que muitos têm pela mesma coisa, assim o desejo de aquisição, algumas vezes apenas para ter o superior a dos demais, supondo dessa forma uma vã estima de si mesmo. Assim, os homens que estiverem satisfeitos com o que possuem devem de certa forma manter o que possuem.

Mas, a razão principal que os homens são levados a ferir-se é a apetite das mesmas coisas, que na maioria das vezes não podem usufruir nem mesmo em comum, também sem a possibilidade de dividir-se.

No que diz respeito aos animais não existe a disputa entre honra e procedência, não ocorrendo ódio e inveja, dessa maneira não existe defeitos nas administrações das sociedades dos animais, não ocorre à concepção vaidosa da própria sabedoria, que é muito comum aos homens. Os animais não distinguem injúria e dano, não procuram censurar seus semelhantes, por esses fatos entendemos que os homens que mais deturpam a sociedade são aqueles, que tem mais prazer e ócio. A língua do homem é a trombeta da sedição. Portanto, o consentimento dos animais é natural, e o dos homens artificial.

Assim, o conflito entre os homens não pode ser resolvido no campo da ética, o único caminho para determinar certo acordo é o campo da política, portanto o estabelecimento de um poder comum a todos, Hobbes resume dizendo que onde não há poder, não pode existir lei, da mesma forma que onde não há lei não existe justiça, sendo que a autoridade quem faz a lei, e não a verdade.

Fazendo um contraponto da natureza do homem, que em seu estado de natureza este seria o seu próprio juiz, porém difere dos outros com respeito aos nomes e designações das coisas, e dessa diferenças é que surgem disputas ocasionando a interrupção da paz, por esse fato Hobbes qualifica que deveria ter uma medida que não gerasse controversa entre todos.

Se os homens têm o poder soberano existem as leis civis para que possam dar medida as suas ações, assim podem ser determinadas as razões certas ou erradas, dessa forma deverão ser tratadas pelas leis. Portanto, para que os homens obtenham a paz é necessário que cada um renuncie ao direito que tem sobre as coisas, para transferir para um poder soberano. Assim, abdicando de seu próprio auto-governo, também de seus julgamentos morais, a própria multidão se tornará uma comunidade política.

Hobbes define duas formas de constituir o poder soberano, capaz de manter uma ordem pública, e consequentemente um vida estável, a primeira via é pela subjugação, portanto pela força; e a segunda, a via política, portanto pelo acordo.

Mesmo o pior dos governos é preferível do que a ausência de governo, é preferível ter o pior governo despótico do que a ausência e a permanente anarquia, a violência generalizada.

Mas, o que leva os homens a instituir um contrato comum a todos, senão o medo, dessa forma é entendido como a virtude cívica por excelência, esse medo que faz os homens abrirem mão de sua condição natural, e aceitem a ordem moral de um soberano, portanto o medo é que faz com que os homens saiam do estado de natureza, que fazem com que compactuem entre si. Concluímos, que o que leva os homens a se formarem em sociedade não é de forma alguma a boa vontade recíproca, mas o medo que cada um tem do outro.
Esse medo leva os homens a buscarem companhia, da mesma forma essa procura para Hobbes não provém do amor mas para obter alguma honra ou mesmo um tipo de proveito.

A famosa consideração que temos de Hobbes é o seu entendimento do estado de natureza, que é a condição natural da humanidade. Os homens nesse estado vivem em constantes guerras, que é uma guerra de todos os homens contra todos os homens. Nesse estado não existe desenvolvimento social, não existe confortos e uso de qualquer tipo de manutenção da sociedade, como por exemplo mercadorias, construções confortáveis, a situação do homem no estado de natureza é miserável, onde as leis existem mais não são eficazes o suficiente, resumindo não há sociedade.

Existem três formas que podem levar os homens a desejar a paz, o primeiro para Hobbes estaria no medo da morte, o segundo o desejo daquelas coisas que são necessárias para uma vida confortável, por último a esperança de obtê-los por meio do trabalho.

Os homens, segundo Hobbes, devem atuar segundo a sua razão e não segundo suas paixões, estas que são usuais no estado de natureza, quando fora desse estado se tem o domínio da razão, a segurança, a paz, a riqueza, a decência e a sociabilidade. A razão e a paixão para Hobbes, são as mesmas em todos os homens, a razão não é o ato de conhecer, mas na verdade é o ato de raciocinar. Na verdade, saber quais são os meios mais adequados para atingir os fins que deseja.

Portanto, as leis da natureza tão necessárias são as normas de paz, pelo fato de serem as normas ditas pela razão, onde os homens chegam ao um acordo comum, este que de ênfase e que os leve a dar fim ao estado de guerra.

As leis especiais de natureza, que são aquelas que derivam da lei primeira e fundamental, que na realidade nos indicam como obter a paz, são dessa forma leis morais, essas são qualidades que levam os homens para tender para a paz e a obediência, as leis da natureza são imutáveis e eternas, pelo fato de todas as iniqüidades humanas não poderem tornar-se legítimas, pelo fato de que jamais a guerra preserva a vida, e a paz a destrua.
Segundo Hobbes mesmo os homens mais ignorantes são fáceis para eles conhecer as leis de natureza, pelo simples fato de um colocar-se no lugar do outro, portanto fazer ao outro aquilo que quisestes que fizessem a ele próprio.

O fato que leva as leis de natureza a não serem leis de fato é puro e simplesmente porque, não existem garantias de que serão cumpridas, enquanto estas não forem ordens do Estado, assim sendo leis civis, que obrigasse os homens a obediência.

Em resumo: para Hobbes, a única forma de instituir um poder comum a todos, que possa defender tal sociedade, ou mesmo mantê-la em comum acordo recíproco, onde os cidadãos possam viver satisfeitos, é conferir toda a força e mesmo o poder a um único homem, a outra possibilidade a uma Assembléia de homens, que possam reduzir as diversidades das vontades transformando-as em uma só. Isso, passaria da simples razão do consentimento, ou concórdia, seria a união de todos em uma única pessoa, com um pacto de cada homem com todos os homens, concluindo a união de todas as pessoas numa só se chama Estado, o grande Leviatã, este criado pela arte humana, que passa a ser um homem artificial, maior que o homem natural, que tem como objetivo a segurança do povo, sendo um formato de homem, este possui nervos; recompensa e o castigo, a força; a riqueza e a prosperidade de todos os membros individuais, saúde; a concórdia, doença; a sedição, e a sua morte; a guerra civil.

[1] O presente trabalho é um breve comentário das obras de Thomas Hobbes.
[2] Professor/tutor na área de História, Geografia, Filosofia e Sociologia, do ensino fundamental e médio do SESI/RS. Pesquisador voluntário no projeto “Estado, Terra e Poder: a questão agrária no judiciário do Planalto Rio-Grandense - República Velha”. E-mail: mendesjeferson@yahoo.com.br
[BL]psicologia, história, ética, história da filosofia, introdução a filosofia, ensino médio, marilena chaui[/BL]

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